DOI:
https://doi.org/10.14483/23464712.11961Publicado:
2018-01-01Uma análise do tema interdisciplinaridade nas principais revistas brasileiras de ensino de ciências
An Analysis of the Interdisciplinarity Theme in the Main Brazilian Journals on Science Education
Un análisis del tema de la interdisciplinariedad en las principales revistas brasilera de enseñanza de las ciencias
Palavras-chave:
science education, scientific journal, analytical bibliography, bibliometrics (en).Palavras-chave:
educación científica, revistas científicas, bibliografia analítica, bibliometría (es).Palavras-chave:
educação científica, revista científica, bibliografia analítica, bibliometria (pt).Downloads
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DOI: http://doi.org/10.14483/23464712.11961
UMA ANÁLISE DO TEMA INTERDISCIPLINARIDADE NAS PRINCIPAIS REVISTAS BRASILEIRAS DE ENSINO DE CIÊNCIAS
AN ANALYSIS OF THE INTERDISCIPLINARITY THEME IN THE MAIN BRAZILIAN JOURNALS ON SCIENCE EDUCATION
UN ANÁLISIS DEL TEMA DE LA INTERDISCIPLINARIEDAD EN LAS PRINCIPALES REVISTAS BRASILERA DE ENSEÑANZA DE LAS CIENCIAS
Guilherme do Amaral Carneiro* *, Carlos Roberto Cardoso Ferreira** **, Fernanda Cristina Pansera***, Rian Stenico Beduschi*****
Cómo citar este artículo: Do Amaral, G., Cardoso C. R., Pansera F. C., Beduschi, R. S. (2018). Uma análise do tema interdisciplinaridade nas principais revistas brasileiras de ensino de ciências. Góndola, Enseñ Aprend Cienc, 13(1), 73-85. doi: http://doi.org/10.14483/23464712.11961.
Recibido: 05 de mayo de 2017; aprobado: 27 de octubre de 2017
* Bacharel e Licenciado em Ciências Biológicas pela Universidade de São Paulo (USP). Mestre em Educação para Ciência pela Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (UNESP) do campus de Bauru. Atualmente está concluindo o doutorado em Educação para Ciência também pela UNESP do Campus de Bauru. Em seus estudos dedica-se sobre educação científica em Museus e Centros de Ciências brasileiros. É fundador e gestor do “Museu do Café de Piratininga”, um centro de ciências localizado no interior de São Paulo. Correio eletrônico: guiamaral.biologo@gmail.com
** Bacharel e Licenciado em Ciências Biológicas pela Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (UNESP), campus de Ilha Solteira. Estudante de mestrado no Programa de Pós-Graduação em Ensino em Processos Formativos, pela mesma instituição. Participa do Grupo de Pesquisa em Currículo: Estudos, Práticas e Avaliação (GEPAC) da UNESP, com estudos nas áreas de Educação Comparada, Educação em Bioquímica e Currículo. Correio eletrônico: karlospherreira@gmail.com
*** Possui Licenciatura em Física pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Sul, campus Bento Gonçalves. Atualmente está concluindo o mestrado em Educação para a Ciência pela Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, onde se dedica ao estudo das Questões Sociocientíficas. Correio eletrônico: fernandacpansera@hotmail.com
**** *Licenciado em Ciências Biológicas pela Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (UNESP). Atualmente está concluindo o mestrado em Educação para Ciência também pela UNESP do campus de Bauru. Em seus estudos dedica-se sobre o Ensino de Evolução Biológica utilizando os princípios da Pedagogia Histórico-Crítica. Trabalha como professor há três anos em um curso pré-universitário da cidade de Botucatu. Correio eletrônico: rianbeduschi@gmail.com
Resumo
A discussão sobre interdisciplinaridade está presente no âmbito da Educação há mais de 30 anos e tem repercutido na área de Ensino de Ciências. Apesar dos diversos trabalhos nos principais periódicos brasileiros da área, ainda existem lacunas que podem trazer informações complementares sobre pesquisas que relacionam interdisciplinaridade e Ensino de Ciências. Com o propósito de preencher parte dessa lacuna, realizamos um estudo cujo objetivo foi identificar estas abordagens em artigos das principais revistas da área no Brasil. Utilizamos os termos interdisciplinaridade e interdisciplinar como descritores nos títulos, resumos e palavras-chave para selecionar os artigos analisados. Foi possível constatar que os estudos se concentram na Educação Básica e tratam principalmente de questões relacionadas ao currículo. As áreas de Ensino de Física e Biologia se destacam, bem como as abordagens Ciência-Tecnologia-Sociedade-Ambiente (CTSA) e Educação Ambiental. Os dados também apontam para um panorama contrastante, de diversificação e decréscimo das pesquisas que relacionam Ensino de Ciências e Interdisciplinaridade.
Palavras chave: educação científica, revista científica, bibliografia analítica, bibliometria
Abstract
The discussion on interdisciplinarity has been present in the scope of Education for over 30 years and has had repercussions in the area of Science Education. Despite the many works in the main Brazilian journals in the area, there are still gaps about complementary information on research that relates interdisciplinarity and Science Education. In order to fill some of this gap, we carried out a study whose objective was to identify these approaches in articles of the main national science education journals. We use the terms interdisciplinarity and interdisciplinary as descriptors in the titles, abstracts, and keywords to select the articles analyzed. It was found that studies focus on basic education and deal mainly with curriculum issues. The areas of physics and biology education stand out, as well as the science environment technology society and Environmental Education approaches. Data also point to a contrasting panorama, of diversification and decrease of the research that relates Science Teaching and Interdisciplinarity.
Keywords: science education, scientific journal, analytical bibliography, bibliometrics.
Resumen
La discusión sobre interdisciplinariedad está presente en el ámbito de la Educación hace mas de 30 años y ha repercutido en el área de Enseñanza de las Ciencias. A pesar de los diversos trabajos publicados en las principales revistas brasileras del área, aún existen vacíos sobre informaciones complementarias de investigaciones que relacionen la interdisciplinariedad con la Enseñanza de las Ciencias. Con el propósito de llenar algo de este vacío, realizamos un estudio cuyo objetivo fue identificar tales perspectivas en artículos de las principales revistas del área en el Brasil. Utilizamos los términos de interdisciplinariedad e interdisciplinar como descriptores en los títulos, resumenes y palabras clave para seleccionar los artículos analizados. Fue posible constatar que los estudios se concentran en la educación básica y tratan principalmente de cuestiones relacionadas al currículo. Se destacan las áreas de enseñanza de la física y biología, así como las perspectivas ciencia-tecnología-sociedad-ambiente (CTSA) y educación ambiental. Los datos también apuntan hacia un panorama de contraste entre la diversificación y la disminución de las investigaciones que relacionan la enseñanza de las ciencias con la interdisciplinariedad.
Palabras clave: educación científica, revistas científicas, bibliografia analítica, bibliometría.
Introdução
Há algum tempo, a discussão sobre interdisciplinaridade tem sido debatida no âmbito da Educação (JAPIASSU, 1976; FAZENDA, 1979) e estas reflexões têm repercutido na área de Ensino de Ciências. Como consequência, observa-se um aumento da produção científica com essas abordagens e temas. Esse fenômeno tem relação com o interesse e crescimento da área de educação em ciências, em especial nas últimas três décadas, como apontaram ALMEIDA e NARDI (2013). SILVA e MEGID NETO (2006) fizeram uma importante pesquisa de estado do conhecimento para compreender as principais linhas de pesquisa em Educação em Ciências. Estes estudos apontaram as abordagens interdisciplinares como sendo uma das mais relevantes. Pesquisas recentes continuam incluindo esta abordagem entre as linhas de investigação em Ensino de Ciências mais importantes (DE LARA, BORGES, 2011; FAZENDA, 2013; RAZERA, 2016). Constata-se assim que a interdisciplinaridade vem se constituindo como um campo de pesquisa de interesse crescente dos pesquisadores brasileiros na área de Ensino de Ciências.
Nas últimas décadas, diversas pesquisas apontam que a educação científica tem promovido um ensino fragmentado e disciplinar, descontextualizado do cotidiano dos estudantes, cujas consequências incluem a perpetuação de uma visão acrítica e dogmática das ciências (FAZENDA, 2013; FOUREZ, 1992; FOUREZ, 1998; KRASILCHIK, MARANDINO, 2004). A ausência de reflexões críticas sobre estas questões tem contribuído para este efeito indesejável, que vai na contramão das propostas atuais de uma educação científica voltada à prática social e à formação cidadã da população (CACHAPUZ et al. 2001). Desde a década de 1990, segundo FAZENDA (2013), os principais congressos e pesquisas discutem estratégias de como renovar o Ensino de Ciências. Ainda de acordo com essa autora, a palavra de ordem destas novas abordagens, no Brasil e no mundo, tem sido a interdisciplinaridade. A pesquisadora apresenta a área como o novo paradigma emergente do conhecimento. Nos últimos 30 anos, a preocupação de exercer com responsabilidade a tarefa de promover pesquisas com este perfil motivou estudos importantes, desde aqueles que se debruçaram sobre a definição mais criteriosa do termo, até outros que realizaram retrospectivas históricas, reflexões sobre suas abordagens e bases epistemológicas. As abordagens interdisciplinares nascem em oposição às propostas de fragmentação do conhecimento e permitiram consideráveis avanços em pesquisas que envolvem trabalho em Educação e Ensino de Ciências (FAZENDA, 2013).
Este trabalho teve a intenção de identificar, nos últimos 3 anos, quais são as principais áreas de interesse dos pesquisadores brasileiros que procuraram relacionar Ensino de Ciências e interdisciplinaridade. Para tanto, fizemos um estudo de natureza quantitativa para trazer dados recentes para as discussões que utilizam estas abordagens. O trabalho de RAZERA (2016) aponta que pesquisas de natureza quantitativa podem enriquecer as discussões, ampliar as informações e expor novos indicadores a respeito das linhas de investigação que compõe determinada área de interesse. Inspirado na proposta do autor, que procurou analisar a importância conferida às pesquisas que relacionavam formação de professores e Ensino de Ciências, este artigo teve o objetivo de enriquecer as informações disponíveis sobre pesquisas que tratam do tema Interdisciplinaridade e Ensino de Ciências. Para isso, identificamos e realizamos uma pesquisa nas quatro principais revistas científicas brasileiras da área. O parâmetro de escolha das revistas foi a classificação pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) na área de Ensino, no levantamento de 2014. Foram estudadas as revistas dedicadas exclusivamente ao Ensino de Ciências, que possuem classificação A1 e A2.
A análise compreendeu os trabalhos publicados entre 2014 e 2016, para avaliar os estudos mais recentes. Selecionamos artigos com os termos interdisciplinaridade e interdisciplinar nos títulos, resumos e palavras-chave dos artigos. Também analisamos os níveis de ensino e as áreas do conhecimento que estes estudos se relacionam, de modo que fosse possível identificar as principais linhas de pesquisa com esta abordagem no Ensino de Ciências brasileiro da atualidade. Foi possível observar que os estudos estão concentrados na Educação Básica e abordam principalmente questões relacionadas ao currículo. Quanto às áreas do conhecimento, prevalecem os trabalhos desenvolvidos em Ensino de Física e em Ensino de Biologia, e as abordagens mais frequentes são de Ciência-Tecnologia-Sociedade- Ambiente (CTSA) e Educação Ambiental. Foi possível perceber também uma diversificação das pesquisas que relacionam Ensino de Ciências e Interdisciplinaridade e, ao mesmo tempo, um decréscimo do número de pesquisas ao longo do período analisado.
Tendo em vista a complexidade das questões que envolvem o Ensino de Ciências e a Interdisciplinaridade, na seção a seguir discutiremos algumas ideias sobre o tema, seus pressupostos e implicações. Em seguida, descreveremos os caminhos metodológicos escolhidos para este estudo, tendo em vista seu caráter quantitativo. Por fim, discutiremos os resultados dessa investigação e nossas considerações finais.
Considerações sobre Interdisciplinaridade e o Ensino de Ciências
Não temos a pretensão de fornecer uma definição do que seja interdisciplinaridade, já que sua conceituação ainda não é um consenso. A proposta é tecer considerações sobre o termo e promover uma reflexão sobre algumas preocupações que emergem a partir de uma nova forma de refletir sobre o mundo. Em nossa opinião, mais importante que conceituar, é refletir a respeito das atitudes que se constituem como interdisciplinares, como apontou FAZENDA (1979), e de como seus pressupostos inspiram estudos nas diferentes áreas de Ensino de Ciências no Brasil.
Segundo FAZENDA (1994), a ideia de interdisciplinaridade surgiu na Europa, especialmente na França e Itália, durante a década de 1960. Para a autora, surgiu como uma espécie de resposta aos movimentos estudantis daquela época, que exigiam um ensino mais voltado para as questões de ordem social, política e econômica da época. Esses movimentos acreditavam que apenas com a integração dos saberes seria possível resolver os grandes problemas da sociedade. No Brasil, ainda segundo a autora, a interdisciplinaridade chegou no final de 1960 e exerceu influência na elaboração da Lei de Diretrizes e Bases 5.692/71 (LDB). Desde então, o uso do termo no sistema educacional brasileiro tem se intensificado, com destaque para LDB 9.394/96 e os Parâmetros Curriculares Nacionais1 (PCN) de 2010, conforme destacaram MOZENA, OSTERMANN (2014), que apontam a abordagem interdisciplinar como base da organização da Educação Básica, em especial do Ensino Médio.
Na literatura em educação é possível observar definições variadas para tratar da interdisciplinaridade, com uma multiplicidade de sentidos. Uma definição clássica apontada por FAZENDA (2008) foi feita em 1970, nos primórdios das discussões sobre o tema, pelo Centro de Pesquisa e Inovação do Ensino (CERI) da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). No documento, segundo a autora, o centro define interdisciplinaridade como a interação existente entre duas ou mais disciplinas. A mesma ainda afirma que tal definição pode incluir a simples comunicação de ideias ou até a integração de conceitos-chave disciplinares. Concordamos com ela que esta definição é abrangente demais e certamente não é suficiente para nortear práticas interdisciplinares, muito menos para ser considerada uma definição do termo propriamente.
Em oposição à conceituação da OCDE, FAZENDA (2008) propõe uma nova forma de decodificar e conceber a interdisciplinaridade. Apoiando-se em FOUREZ (2001) e LENOIR (1998) a autora distingue o termo a partir de suas finalidades, diferenciando a interdisciplinaridade científica da escolar e da profissional ou prática. Para a autora, cada uma destas finalidades se organiza a partir de objetivos próprios e compreendem formas distintas de construção do conhecimento. Discutiremos brevemente o surgimento do termo disciplina nas ciências e tomaremos aqui o contexto da interdisciplinaridade no ensino, mais especificamente no Ensino de Ciências.
Em uma perspectiva sociohistórica, a noção de disciplina como comportamento é antiga, mas as de disciplinas científicas são mais recentes (FOUREZ, 1995). A introdução dessa noção, segundo o filósofo francês, ocorre no século XVIII e, a partir daí, passamos a organizar os saberes em disciplinas e princípios fundamentais. FOUREZ (1995) apoia-se nas ideias do filósofo das ciências Thomas Kuhn para tratar dos critérios atuais reconhecidos para se falar do surgimento e estabelecimento de uma disciplina. Segundo KUHN (2005), para que esse estabelecimento ocorra é necessária uma institucionalização das práticas de pesquisa e de ensino em torno de uma comunidade profissional, de instituições e de um paradigma, definindo seus pressupostos e objetivos dos saberes construídos. Para FOUREZ (1995), estas comunidades descobrirão interesses particulares que eles defenderão socialmente. O autor analisa que, pouco a pouco, os cientistas tendem a esquecer a origem das suas disciplinas e parecerá tão natural, que ficarão desconectados das particularidades sociohistórica que a fizeram nascer. Ele ainda aponta que estas características produziram recentemente o surgimento de disciplinas distintas, que chamamos de ciências fundamentais, ciências de base ou “duras”.
FOUREZ (1998) reconhece que o conhecimento disciplinar demonstrou-se uma potência na história das ciências e uma estratégia de conhecimento estabelecida, eficaz e padronizada. Observa também que a padronização permitiu que as disciplinas fossem mais facilmente ensinadas. No entanto, o autor aponta que, atualmente, as disciplinas são pouco adaptadas às necessidades de inúmeras situações educacionais. Para o filósofo francês, o problema é que elas são organizadas muito mais em volta de princípios, produtos da sua história, que em torno de problemas sociais atuais concretos. O autor afirma ainda que no sistema escolar, historicamente, as disciplinas encontraram um nicho, tanto no ensino secundário como no superior. Neles os saberes são ensinados partindo das ciências de base e a imagem da descoberta de saberes universais e genéricos prevalece.
FOUREZ (1998) explicita que os conhecimentos disciplinares não são organizados ao redor de problemas concretos a serem resolvidos, mas em volta de questões estruturadas por pressupostos teóricos. Para o autor, apesar da disciplinarização das ciências ter trazido ordem e padronização ao ensino, ela também trouxe perda dos sentidos, já que os estudantes parecem ter a impressão de que os cursos que eles recebem são mais dedicados a fazê-los entrar na cultura dos cientistas do que lhes permitir organizar o mundo à sua própria maneira. Segundo ele, isso tem se agravado, já que o ensino tem sido mais e mais disciplinar, em especial a partir do momento em que os educadores também passaram a ter uma formação mais voltada para as disciplinas científicas de base do que sobre as humanidades.
No Brasil, em 1976, HILTON JAPIASSU foi um dos primeiros pesquisadores brasileiros a refletir e escrever sobre o assunto. O autor publicou o livro Interdisciplinaridade e patologia do saber, no qual discute a necessidade de superar os limites impostos pelo conhecimento compartimentado, fragmentado e da especialização cada vez maior das disciplinas científicas. Na obra, o autor aponta que esta especialização promoveu um afastamento entre as disciplinas, que resultou na total ausência de diálogo entre as ciências de base, mas em especial delas com as ciências humanas (JAPIASSU, 1976). Para ele, a ciência como única fonte de conhecimento válido não se sustenta, e as diversas crises da sociedade humana no final do século XX também são reflexo de um saber e um existir fragmentados. Uma das pioneiras em estudos na área, Ivani Fazenda, ainda na década de 1970, publicou a obra Integração e interdisciplinaridade no ensino brasileiro: efetividade ou ideologia, onde se aprofunda sobre o termo com o objetivo de construir um conceito para interdisciplinaridade. A autora define interdisciplinaridade como uma atitude perante o conhecimento. Em sua obra, a pesquisadora propõe que interdisciplinaridade seria um novo olhar que permitiria compreender e, por consequência, transformar o mundo. Seria uma postura capaz de restituir a unidade perdida do saber (FAZENDA, 1979).
Nas décadas seguintes, FAZENDA (2008) afirma que os estudos no Brasil passam a se concentrar na busca dos princípios teóricos e nos processos da abordagem interdisciplinar. Para a autora, a interdisciplinaridade continuou a se disseminar, mas sem embasamento. Segundo ela, o amadurecimento das pesquisas na área e a conscientização a respeito da abordagem interdisciplinar, possibilitaram superar o conhecimento fragmentado e permitiram maior diálogo entre os conhecimentos especializados. Ela aponta que neste processo de amadurecimento, questões teóricas, em especial epistemológicas e ideológicas, passam a ser consideradas nas abordagens interdisciplinares. Apoiando- se na perspectiva de abordagem proposta por LENOIR (2005), a autora observa que, para melhor compreender o termo interdisciplinar, é necessário considerar o que a ela denominou de lógica do sentido, da funcionalidade e da intencionalidade. FAZENDA (2008), aponta que o saber interdisciplinar é legitimado pela capacidade de abstração, que ela denominou saber saber, pelo saber prático ou saber fazer, e por uma terceira dimensão, que a autora denominou saber ser interdisciplinar, que por sua vez permitiria unir intencionalidade e funcionalidade.
Os estudos de LENOIR (2001) e FAZENDA (2008) enfatizam a questão de as disciplinas científicas não darem conta de enfrentar problemáticas complexas sozinhas. Segundo FAZENDA (2008), é necessário que as diferentes esferas da sociedade revejam suas exigências, já que a vida nas sociedades atuais se desloca para situações cada vez mais complexas. No contexto da interdisciplinaridade no ensino, a autora aponta que sua perspectiva é educativa e a construção dos conhecimentos na área se dá de forma distinta dos saberes das ciências de base. No ensino, segundo a autora, as noções, finalidades, habilidades e técnicas visam favorecer sobretudo a aprendizagem, o que permite o respeito aos conhecimentos prévios dos alunos num processo de diálogo e interação de saberes e a integração destes às sociedades hipersofisticadas da atualidade. Para a autora, é necessário superar a disciplinarização no ensino secundário e superior. O ensino atual, segunda ela, passa os conhecimentos de forma acrítica, como verdades científicas. FAZENDA (2008) e FOUREZ (2001) concordam que um dos caminhos para superar estas questões envolve o ensino de ciências orientado por projetos ou situações-problema, que permitem abordagens que levam em consideração as múltiplas dimensões de um problema, como a econômica, social e cultural. FOUREZ (2001) afirma que o resultado do ensino disciplinar atual foi a perda de sentido do Ensino de Ciências e da compreensão, por parte dos estudantes, das relações entre ciência e sociedade e entre a ciência e o cotidiano.
Observando a complexidade dessas questões, o Ensino de Ciências vem discutindo a adoção de práticas interdisciplinares na área como uma das possibilidades para sua melhoria. A discussão proposta acima nos permite refletir sobre a maneira que a ideia de interdisciplinaridade tem sido apropriada pelas pesquisas em Ensino de Ciências. Mas algumas questões permanecem e foram objeto de estudo deste trabalho.
Metodologia
Para elaborar este artigo realizamos um levantamento quantitativo e utilizamos técnicas adaptadas de estudos bibliométricos. Foram identificados 444 artigos de quatro revistas brasileiras em Educação em Ciência, no período entre 2014 e 2016. Foram analisadas as revistas: Ciência e Educação, Ensaio: Pesquisa em Educação em Ciências, Investigação em Ensino de Ciências e a Revista Brasileira de Pesquisa em Educação em Ciências. Estas revistas foram escolhidas em virtude de apresentarem o escopo direcionado para a Educação em Ciências e por serem avaliadas pela CAPES nos estratos A1 e A2 da área de Ensino.
Os artigos foram identificados nos sítios das próprias revistas e transferidos para nossos computadores a fim de serem tabulados e analisados. Utilizamos os aplicativos Microsoft Excel® (versão 2011), Microsoft Bloco de Notas Professional® (versão 6.1) e Microsoft Office Word® (versão 2011) para organizar os dados. Esses procedimentos de sistematização dos dados permitem futuras verificações e identificações de eventuais discrepâncias nas análises dos dados obtidos. Estes aplicativos permitiram a busca de descritores específicos nos artigos identificados. Segundo RAZERA (2016), descritores são termos que identificam conceitos de uma determinada área do conhecimento sem problemas de compreensão de sentido. Segundo FERREIRA (1999) e RIBEIRO (2006) os descritores auxiliam na identificação de determinados assuntos de trabalhos científicos e podem ser usados como indexadores em bancos de dados. Assim como ressaltado por RAZERA (2016), o conceito de descritores utilizado nesta publicação não deve ser confundido com palavras-chave informadas nos artigos, já que nossa busca não se restringiu a elas.
Os descritores buscados em cada um dos 444 artigos analisados foram “interdisciplinaridade” e “interdisciplinar”. Os termos em inglês e espanhol também foram objeto de análise nos artigos publicados nas revistas analisadas. Após esta primeira etapa de identificação dos artigos revisamos todos os artigos com o objetivo de filtrar eventuais problemas e incongruências. Aqueles artigos que apresentavam ao menos um dos descritores mencionados no título, no resumo ou nas palavras-chave foram selecionados para análise.
As análises dos dados e os resultados obtidos se deram em duas etapas. A primeira apresenta os indicadores bibliométricos do espectro de artigos identificados que citam os termos utilizados como descritores. Esses estudos foram comparados ao número total de artigos de cada revista para identificar a importância conferida às abordagens em interdisciplinaridade por esses meios de comunicação científica. A segunda etapa consistiu em identificar as linhas ou áreas de pesquisas, assuntos e perfil das investigações em interdisciplinaridade nos últimos três anos no Brasil. FERNÁNDEZ CANO e BUENO SÁNCHEZ (1998) apontam que há uma diversidade de indicadores bibliométricos que podem ser utilizados. Os indicadores escolhidos tiveram o propósito de identificar as principais áreas que relacionam ensino de ciências e interdisciplinaridade em suas pesquisas.
Abordagens interdisciplinares e ensino de ciências nas principais revistas brasileiras da área
As publicações nas principais revistas brasileiras de Ensino de Ciências podem trazer importantes indicadores sobre pesquisas que relacionam interdisciplinaridade e Ensino de Ciências. Podem ainda evidenciar a relevância dada ao tema, quais áreas estão sendo priorizadas, quais níveis de ensino ocorrem, dentre diversas outras questões relevantes para interessados nesta abordagem. As revistas são meios de comunicação importantes e inegáveis fontes de inspiração para pesquisas científicas. Este trabalho analisou as quatro principais revistas da área no Brasil. Nesta primeira parte, identificamos e discutimos indicadores bibliométricos dos artigos que mencionaram pelo menos um dos descritores, ou seja, os termos interdisciplinaridade e/ou interdisciplinar. Dentre os 444 artigos publicados entre 2014 e 2016 pelas revistas analisadas, selecionamos 22 artigos que se declaravam como pesquisas que relacionavam interdisciplinaridade e ensino de ciências.
A revista com maior número de publicações que trata do tema interdisciplinaridade foi a revista Ciência e Educação com 9 artigos publicados no período, seguida pela Revista Brasileira de Pesquisa em Educação em Ciências com 5 artigos publicados. As revistas Pesquisa em Educação em Ciências e Investigação em Ensino de Ciências publicaram apenas 4 artigos nos últimos 3 anos dentro desta temática.
A presença dos descritores nos títulos, nas palavras- chave e nos resumos dos trabalhos analisados indicam que os pesquisadores descrevem seus trabalhos como inseridos na área de interesse objeto desta análise. Esse parâmetro, por sua vez, indicou que apenas 5%, em média, dos artigos publicados no período compreendido por este trabalho, relacionam o tema interdisciplinaridade e o Ensino de Ciências. Os dados indicam uma baixa quantidade de estudos que se autodenominam como abordagens interdisciplinares em Ensino de Ciências. Outro ponto que merece atenção é a evolução temporal dos artigos publicados. Nas revistas analisadas há oscilações no número total de artigos publicados a cada ano, ao calcular a frequência de artigos publicados sobre interdisciplinaridade em relação ao número total de publicações anuais, percebemos que houve uma queda significativa de trabalhos sobre o tema no ano de 2016. Quando a análise foi feita por revista, encontramos oscilações, mas, de modo geral, também demonstra a tendência de queda em 3 das 4 revistas. A revista da RBPEC é a única que ampliou as publicações entre 2015 e 2016, já que em 2015 não havia publicado nenhum artigo que relacionava Ensino de Ciências e interdisciplinaridade. As informações tabuladas nesta primeira etapa foram descritas na tabela 1.
Tabela 1. Artigos analisados nas 4 principais revistas em ensino de ciências no Brasil entre 2014 e 2016.
Fonte: elaborada pelos autores.
A ideia de interdisciplinaridade pressupõe práticas e atitudes perante o conhecimento que possibilitam encontro, cooperação e diálogo entre diferentes áreas do conhecimento. Os envolvidos em um trabalho ou pesquisa com esta abordagem estão preocupados com diversas questões e, essencialmente, comprometidos com a melhoria do ensino de ciências. Com este olhar, na segunda etapa deste trabalho, nossa análise consistiu em tabular as áreas que estes trabalhos se relacionavam, os níveis de ensino em que os autores declaravam ocorrer, dentre outras questões. Para atingir estes objetivos, analisamos os mesmos itens que utilizamos para definir a abordagem interdisciplinar, ou seja, os título, as palavras-chave e os resumos. Na tabela 2, os dados obtidos foram numerados para que fosse possível realizar análises posteriormente.
Os itens 6 e 13, que tratam do Ensino Técnico e do Ensino de Matemática foram incluídos por nós, mesmo não tendo sido mencionados nos artigos analisados, como margem de comparação com as demais áreas do conhecimento e níveis de ensino. A intenção foi demonstrar que, no período analisado, não foram divulgadas pesquisas que tratavam destas áreas.
Após a definição das principais áreas de pesquisa que os artigos se relacionavam, segundo os próprios autores, detalhamos esta análise por revista selecionada. Para sistematização dos dados, decidimos numerar os artigos em números arábicos (de 1 ao 22) e apresentar as análises referente às áreas de pesquisa, citando apenas o número relacionado a cada um deles (Tabela 2). A Tabela 3 descreve esta análise por artigo e revista. Os resultados evidenciam que os artigos, muitas vezes, se relacionam a mais que uma área do conhecimento ou nível de ensino, o que demonstra a complexidade das pesquisas com abordagens interdisciplinares.
Diante da definição das áreas que os estudos se relacionavam e níveis de ensino que seus autores afirmavam ocorrer e pesquisar, foi elaborada a tabela 4. Ela indica as principais tendências dos trabalhos em interdisciplinaridade no período e em quais áreas de pesquisa estão concentradas.
Tabela 2. Áreas de pesquisa dos artigos analisados, segundo os próprios autores.2
Fonte: elaborado pelos autores.
Percebemos que a maioria das pesquisas que relacionam Ensino de Ciências e interdisciplinaridade se concentram na Educação Básica, sendo que 11 trabalhos foram produzidos nesse nível de ensino (6 referentes ao Ensino Médio, 3 ao Ensino Fundamental e 2 à Educação de Jovens e Adultos).
Tabela 3. Áreas e níveis de ensino dos artigos analisados segundo os próprios autores.
Fonte: elaborado pelos autores.
Tabela 4. Áreas e abordagens em interdisciplinaridade nos artigos analisados segundo os próprios autores.
Fonte: elaborado pelos autores.
Constatamos também que 7 trabalhos tratavam especificamente sobre o Ensino de Ciências, 4 sobre o Ensino de Física, 4 sobre o Ensino de Biologia, 3 sobre o Ensino de Química e 1 sobre Literatura. Conforme citado anteriormente, não encontramos trabalhos relacionados ao Ensino de Matemática e a interdisciplinaridade, mas sua inserção enquanto área de pesquisa faz-se necessária neste trabalho, devido à natureza das revistas analisadas, que tem o Ensino de Matemática como uma das áreas de ciências que publicam.
Ficou evidente também que as discussões sobre currículo foram as que mais se repetiram nas pesquisas. Sendo que esse tema foi citado em 8 trabalhos dos 22 analisados, uma concentração significativa. As abordagens em Ciência, Tecnologia, Sociedade e ambiente (CTS/CTSA) e Educação Ambiental vem logo em seguida, elas foram discutidas em 4 artigos. Com apenas 2 artigos publicados por área de pesquisa no período, observamos trabalhos que abordavam questões epistemológicas em interdisciplinaridade e trabalhos relacionados ao ENEM (Exame Nacional do Ensino Médio). Constatamos outros temas relevantes nos dados obtidos, mas pouco realizados ou pouco divulgados, como as pesquisas sobre revisões bibliográficas, as de divulgação científica, as que tratam sobre análise e utilização dos livros didáticos e as que abordam o tema da aprendizagem significativa.
MOZENA, OSTERMANN (2014) em artigo que fizeram uma revisão bibliográfica sobre interdisciplinaridade no ensino de ciências da natureza concluíram que existe um crescimento de produção na área. O estudo das autoras abrangeu o período de 1980 a 2012 e incluiu artigos das principais revistas da área e publicações em congressos de referência em ensino de ciências. Diferentemente da constatação das autoras, nosso trabalho observou um decréscimo de publicações sobre interdisciplinaridade. Esse fato pode indicar um esgotamento do tema ou um desinteresse pelo tema, seja pelos pesquisadores na área ou pelas revistas. Este ponto merece atenção dos pesquisadores na área para que as causas deste decréscimo sejam elucidadas.
Uma das questões que chamou nossa atenção foi a concentração de estudos dedicados a pesquisar os currículos em Ensino de Ciências. Estes trabalhos indicam que as pesquisas atuais estão preocupadas em se desvencilhar da tradição curricular linear e tradicional, como apontaram MOZENA, OSTERMANN (2014). Apesar disso, as análises realizadas apontam que as pesquisas em interdisciplinaridade, embora sejam bastante diversificadas, estão decrescendo.Tais pontos indicam que os problemas na efetivação da interdisciplinaridade no Ensino de Ciências permanecem nos diversos níveis de ensino e novas pesquisas na área continuam necessárias.
Considerações Finais
As reflexões e os questionamentos propostos pelos pesquisadores em interdisciplinaridade no Brasil permanecem extremamente atuais e relevantes. Ainda se faz necessário superar esta fragmentação do saber no Ensino de Ciências, já que os estudos em educação continuam demonstrando que ele permanece desinteressante para os estudantes, fragmentado, disciplinar e multiplicador de uma visão dogmática. Além disso, raramente o ensino é orientado por projetos interdisciplinares contextualizados ao cotidiano dos alunos, como sugerido por pesquisadores da área. Estas questões parecem estar na origem do afastamento dos estudantes das ciências e, no Brasil, as implicações deste afastamento refletem-se não apenas no desinteresse pelas ciências, mas também na baixa participação pública em questões sociocientíficas que mereceriam participação ativa da sociedade.
A bibliografia aqui apresentada ainda é pequena diante dos inúmeros estudos em interdisciplinaridade na área de educação e no ensino de ciências. Não tivemos a pretensão de apresentar todas as investigações nem de esgotar a discussão sobre o tema. Nossa proposta foi realizar um recorte dos estudos mais atuais que se propuseram em relacionar interdisciplinaridade e ensino de ciências. Acreditamos que o Ensino de Ciências precisa superar esta fragmentação do conhecimento e suas consequências e, as abordagens interdisciplinares, são uma das possibilidades para esta superação.
A intenção de reverter esse quadro de fragmentação do conhecimento pode estar na origem da diversificação das abordagens interdisciplinares. Neste estudo observamos que o leque de assuntos e linhas de estudo são amplos. No entanto, observamos também que os estudos na área são escassos e decresceram nos últimos 3 anos, indicando um aparente desinteresse de pesquisadores ou das revistas de referência pelas abordagens interdisciplinares. Um ponto interessante e positivo das análises realizadas é que os pesquisadores na área estão muito preocupados com a Educação Básica e com o currículo de ciências. Este fato indica que os pesquisadores na área veem que, para a superação deste ensino fragmentado, a principal solução seria a revisão curricular e abordagens como a CTSA e a Educação Ambiental.
Os estudos também demonstraram que os pesquisadores das áreas de física, devido sua tradição histórica no ensino de ciências, permanecem aqueles que mais publicaram artigos sobre interdisciplinaridade. Uma questão bastante relevante observada foi o decréscimo dos estudos em interdisciplinaridade que relacionam estudos das áreas de ciências humanas e ciências da natureza. Aparentemente os estudos no período analisado permanecem restritos a uma área do conhecimento, mesmo que seus autores o considerassem como abordagem interdisciplinar.
As análises realizadas buscaram traçar um panorama da produção relacionada ao tema interdisciplinaridade no ensino de ciências nas principais revistas brasileiras da área. Os resultados indicaram questões interessantes, como uma produção diversificada, concentrada na Educação Básica, especialmente no ensino médio e fundamental. Os estudos também demonstraram que os pesquisadores na área estão interessados em discutir o currículo de ciências. Percebemos que as discussões sobre interdisciplinaridade e currículo nos trabalhos, tem relação com a reformulação dos PCNs e com a reforma do ensino médio, visto que essas mudanças questionam o modelo de ensino tradicional, onde as disciplinas estão desvencilhadas umas das outras.
É importante ressaltar que os artigos analisados nesta pesquisa podem ser ainda explorados sob outros aspectos como, por exemplo, autoria, referencial bibliográfico, natureza do trabalho, dentre outros. No entanto, neste trabalho a análise centrou-se em levantar quais são as áreas de pesquisa dos artigos, destacando questões quantitativas sobre a frequência das áreas nos 22 trabalhos analisados.
Notas a pie de página
1 Os PCNs são diretrizes curriculares elaboradas pelo Governo Federal que orientam a Educação Básica nas redes pública e privada de ensino brasileiras.
2 O Exame Nacional do Ensino Médio foi criado em 1998 pelo Ministério da Educação do Brasil, sendo utilizado para avaliar o desempenho dos estudantes concluintes do Ensino Médio. Atualmente é a principal forma de acesso à Educação Superior no Brasil.
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