Paisagens sonoras, música e industria cultural: problematização na formação inicial de professores de física

Sound landscapes, music and cultural industry: problematization in pre-service physics teachers education

Paisajes sonoros, música e industria cultural: problematización en la formación inicial de profesores de física

Autores/as

Palabras clave:

teaching, learning, initial training, physics teaching and music, physics and culture (en).

Palabras clave:

enseñanza, aprendizaje, formación inicial (es).

Palabras clave:

ensino, aprendizagem, formação inicial (pt).

Biografía del autor/a

José de Oliveira Costa Junior, Universidade Tecnológica Federal do Paraná - UTFPR, Brasil

Licenciado em Física e Mestrando em Ensino de Ciências do Programa de Pós-Graduação em Formação Científica, Educacional e Tecnológica - PPGFCET pela Universidade Tecnológica Federal do Paraná - UTFPR (Brasil). Docente da Secretaria de Estado da Educação do Paraná - SEED (Brasil).

Noemi Sutil, Universidade Tecnológica Federal do Paraná - UTFPR, Brasil

Licenciada em Física e Mestre em Educação pela Universidade Estadual de Ponta Grossa - UEPG (Brasil). Doutora em Educação para a Ciência pela Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” - UNESP (Brasil). Docente e pesquisadora do Departamento Acadêmico de Física e Programa de Pós-Graduação em Formação Científica, Educacional e Tecnológica - PPGFCET da Universidade Tecnológica Federal do Paraná - UTFPR (Brasil).

João Amadeus Pereira Alves, Universidade Tecnológica Federal do Paraná - UTFPR, Brasil

Licenciado em Física pela Universidade Estadual de Ponta Grossa - UEPG (Brasil). Mestre e Doutor em Educação para a Ciência pela Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” - UNESP (Brasil). Docente e pesquisador do Departamento Acadêmico de Física e Programa de Pós-Graduação em Formação Científica, Educacional e Tecnológica - PPGFCET da Universidade Tecnológica Federal do Paraná - UTFPR (Brasil).

Referencias

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Cómo citar

APA

de Oliveira Costa Junior, J., Sutil, N., y Pereira Alves, J. A. (2019). Paisagens sonoras, música e industria cultural: problematização na formação inicial de professores de física. Góndola, Enseñanza y Aprendizaje de las Ciencias, 14(2), 322–339. https://doi.org/10.14483/23464712.13852

ACM

[1]
de Oliveira Costa Junior, J. et al. 2019. Paisagens sonoras, música e industria cultural: problematização na formação inicial de professores de física. Góndola, Enseñanza y Aprendizaje de las Ciencias. 14, 2 (jul. 2019), 322–339. DOI:https://doi.org/10.14483/23464712.13852.

ACS

(1)
de Oliveira Costa Junior, J.; Sutil, N.; Pereira Alves, J. A. Paisagens sonoras, música e industria cultural: problematização na formação inicial de professores de física. Góndola Enseñ. Aprendiz. Cienc. 2019, 14, 322-339.

ABNT

DE OLIVEIRA COSTA JUNIOR, José; SUTIL, Noemi; PEREIRA ALVES, João Amadeus. Paisagens sonoras, música e industria cultural: problematização na formação inicial de professores de física. Góndola, Enseñanza y Aprendizaje de las Ciencias, [S. l.], v. 14, n. 2, p. 322–339, 2019. DOI: 10.14483/23464712.13852. Disponível em: https://revistas.udistrital.edu.co/index.php/GDLA/article/view/13852. Acesso em: 23 nov. 2024.

Chicago

de Oliveira Costa Junior, José, Noemi Sutil, y João Amadeus Pereira Alves. 2019. «Paisagens sonoras, música e industria cultural: problematização na formação inicial de professores de física». Góndola, Enseñanza y Aprendizaje de las Ciencias 14 (2):322-39. https://doi.org/10.14483/23464712.13852.

Harvard

de Oliveira Costa Junior, J., Sutil, N. y Pereira Alves, J. A. (2019) «Paisagens sonoras, música e industria cultural: problematização na formação inicial de professores de física», Góndola, Enseñanza y Aprendizaje de las Ciencias, 14(2), pp. 322–339. doi: 10.14483/23464712.13852.

IEEE

[1]
J. de Oliveira Costa Junior, N. Sutil, y J. A. Pereira Alves, «Paisagens sonoras, música e industria cultural: problematização na formação inicial de professores de física», Góndola Enseñ. Aprendiz. Cienc., vol. 14, n.º 2, pp. 322–339, jul. 2019.

MLA

de Oliveira Costa Junior, José, et al. «Paisagens sonoras, música e industria cultural: problematização na formação inicial de professores de física». Góndola, Enseñanza y Aprendizaje de las Ciencias, vol. 14, n.º 2, julio de 2019, pp. 322-39, doi:10.14483/23464712.13852.

Turabian

de Oliveira Costa Junior, José, Noemi Sutil, y João Amadeus Pereira Alves. «Paisagens sonoras, música e industria cultural: problematização na formação inicial de professores de física». Góndola, Enseñanza y Aprendizaje de las Ciencias 14, no. 2 (julio 31, 2019): 322–339. Accedido noviembre 23, 2024. https://revistas.udistrital.edu.co/index.php/GDLA/article/view/13852.

Vancouver

1.
de Oliveira Costa Junior J, Sutil N, Pereira Alves JA. Paisagens sonoras, música e industria cultural: problematização na formação inicial de professores de física. Góndola Enseñ. Aprendiz. Cienc. [Internet]. 31 de julio de 2019 [citado 23 de noviembre de 2024];14(2):322-39. Disponible en: https://revistas.udistrital.edu.co/index.php/GDLA/article/view/13852

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PAISAGENS SONORAS, MÚSICA E INDÚSTRIA CULTURAL: PROBLEMATIZAÇÃO NA FORMAÇÃO INICIAL DE PROFESSORES DE FÍSICA

SOUND LANDSCAPES, MUSIC AND CULTURAL INDUSTRY: PROBLEMATIZATION IN PRE-SERVICE PHYSICS TEACHERS EDUCATION

PAISAJES SONOROS, MÚSICA E INDUSTRIA CULTURAL: PROBLEMATIZACIÓN EN LA FORMACIÓN INICIAL DE PROFESORES DE FÍSICA

José de Oliveira Costa Junior*, Noemi Sutil**, João Amadeus Pereira Alves***

Cómo citar este artículo: Costa, J.O., Sutil, N. y Pereira Alves, J.A. (2019). Paisagens sonoras, música e industria cultural: problematização na formação inicial de profesores de física. Gdola, Ensenza y Aprendizaje de las Ciencias, 14(2), 322-339. DOI: http://doi.org/10.14483/23464712.13852

Recibido: 18 de septiembre de 2018; aprobado: 26 de diciembre de 2018


* Licenciado em Física e Mestrando em Ensino de Ciências do Programa de Pós-Graduação em Formação Científica, Educacional e Tecnológica - PPGFCET pela Universidade Tecnológica Federal do Paraná - UTFPR (Brasil). Docente da Secretaria de Estado da Educação do Paraná - SEED (Brasil). Correio eletrônico: thejosephjr@gmail.com - ORCID: https://orcid.org/0000-0003-0064-4052

** Licenciada em Física e Mestre em Educação pela Universidade Estadual de Ponta Grossa - UEPG (Brasil). Doutora em Educação para a Ciência pela Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” - UNESP (Brasil). Docente e pesquisadora do Departamento Acadêmico de Física e Programa de Pós-Graduação em Formação Científica, Educacional e Tecnológica - PPGFCET da Universidade Tecnológica Federal do Paraná 
- UTFPR (Brasil). Correio eletrônico: noemisutil@utfpr.edu.br - ORCID: https://orcid.org/0000-0003-3095-3999

*** Licenciado em Física pela Universidade Estadual de Ponta Grossa - UEPG (Brasil). Mestre e Doutor em Educação para a Ciência pela Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” - UNESP (Brasil). Docente e pesquisador do Departamento Acadêmico de Física e Programa de Pós-Graduação em Formação Científica, Educacional e Tecnológica - PPGFCET da Universidade Tecnológica Federal do Paraná ­UTFPR (Brasil). Correio eletrônico: joaoalves@utfpr.edu.br - ORCID: https://orcid.org/0000-0002-1850-0260 


Resumo 

Neste trabalho são explicitadas considerações sobre atividades educacionais en­volvendo análise de paisagens sonoras, música e indústria cultural, desenvolvidas com estudantes de um curso de Licenciatura em Física, numa instituição de Ensino Superior na cidade de Curitiba, estado do Paraná, Brasil, em 2016. Este trabalho possui fundamentos na Teoria Crítica, conforme proposições de Theodor Adorno, na teoria da ação dialógica, de Paulo Freire, e em estudos de paisagens sonoras, de acordo com Raymond Murray Schafer. As ações compreendidas neste trabalho agregaram a identificação e a caracterização de elementos de paisagem sonora e música, com estabelecimento de relações com a indústria cultural. Nesse contexto foram constituídos dados por meio de observação direta, com registros escritos em diário de campo e gravações em áudio, assim como produções es­critas dos participantes. Esses dados foram analisados conforme pressupostos e características de análise de conteúdo apresentada por Laurence Bardin. Entre os resultados podem ser destacados avanços em relação ao desenvolvimento de percepção auditiva, aprendizagem de conteúdos de Física, críticas à paisagem sonora observada, aspectos musicais e reflexão em relação às imposições da indústria cultural.

Palavras chaves: ensino, aprendizagem, formação inicial. 

Abstract 

In this paper, we explained considerations on educational activities involving analy­sis of sound landscapes, music, and cultural industry, developed with undergraduate students in Physics Teacher Education course, in a University at Curitiba city, State of Paraná, Brazil. in 2016. This work has its grounds on Critical Theory, according to propositions of Theodor Adorno, on Theory of the Dialogic Action, by Paulo Freire, and on studies of soundscapes, according to Raymond Murray Schafer. The actions included in this work comprehended the identification and characterization of ele­ments of soundscapes and music, establishing relations with the cultural industry. In this context, data were collected through direct observation, with written records in field diary and audio recordings, as well as written productions of the participants. These data were analyzed according to assumptions and characteristics of Content Analysis presented by Laurence Bardin. Among the results it can be highlighted advances concerning the development of listening perception, learning of Physics contents, critics towards the observed soundscapes, and reflections about the impo­sitions of the cultural industry.

Keywords: teaching, learning, initial training, physics teaching and music, physics and culture.

Resumen 

En este trabajo se explicitan consideraciones sobre actividades educativas invo­lucrando análisis de paisajes sonoros, música e industria cultural, desarrolladas con estudiantes de un programa de Licenciatura en Física, en una Institución de Educación Superior, en la ciudad de Curitiba, estado de Paraná, Brasil, en 2016. Este trabajo tiene fundamentos en la teoría crítica, según la propuesta de Theodor Adorno; en la teoría de la acci dialica, de Paulo Freire, y en estudios de paisa­jes sonoros, de acuerdo con Raymond Murray Schafer. Las acciones comprendidas en este trabajo permitieron la identificación y la caracterización de elementos de paisajes sonoros y de música, estableciendo relaciones con la industria cultural. En ese contexto fueron constituidos datos por medio de la observación directa, con registros escritos en un diario de campo y grabaciones en audio, así como producciones escritas de los participantes. Estos datos se analizaron según los supuestos y las características de análisis de contenido presentada por Laurence Bardin. Entre los resultados se destacan avances en relación al desarrollo de la percepción auditiva, el aprendizaje de contenidos de Física, críticas al paisaje sonoro observado y aspectos musicales, y la reflexión sobre las imposiciones de la industria cultural.

Palabras clave: enseñanza, aprendizaje, formación inicial. 


Introdução

Os aspectos sonoros das realidades vivenciais dos sujeitos contemporâneos expressam tendência à imposição social e cultural em detrimento de possibilidades de opção. Esses fatores compreen­dem as paisagens sonoras e a música. Perpassam cenários imersos em controvérsias no escopo das relações entre ciência, tecnologia, sociedade, am­biente e arte.

No domínio da educação científica, por outro lado, há demanda por extrapolação de abordagem meramente linguístico-conceitual desprovida de articulações contextuais problematizadoras. Em relação à Física, explicita-se a crítica à abordagem restritiva desses aspectos sonoros, circunscritos em diversas situações à apresentação das características ondulatórias do som (MONTEIRO JÚNIOR, 2012).

Em estudo de revisão de literatura foram anali­sados 23 artigos, publicados nos eventos brasileiros Encontro de Pesquisa em Ensino de Física (EPEF) e Simpósio Nacional de Ensino de Física (SNEF), entre os anos 2006 e 2016, que discutem a abordagem de conceitos físicos articulados a aspectos sonoros e musicais. Nesses trabalhos, evidenciou-se pouca relação desses conteúdos com os contextos viven­ciais dos estudantes.

Essa ausência de aprofundamento na análise da relação entre sons e realidade vivencial remete a de­manda por atividades educacionais que visem essa abordagem, que envolvam a articulação entre pai­sagens sonoras, música e seus aspectos científicos, tecnológicos, sociológicos, ambientais, artísticos e culturais em sala de aula.

Ressalta-se, contudo, que para essa articulação entre os conhecimentos de Física e contextos dos sujeitos, faz-se necessário que o indivíduo “saiba ouvir”, para que possa fazer discernimentos sobre as características daquilo que escuta. Nesse sentido, SCHAFER (2001) destaca:

Sempre achei que a educação pública é o mais importante aspecto do nosso trabalho. Em primeiro lugar precisamos ensinar as pessoas como ouvir mais cuidadosa e criticamente a paisagem sono­ra; depois precisamos solicitar sua ajuda, parar e planejá-la. Em uma sociedade verdadeiramente democrática, a paisagem sonora será planejada por aqueles que nela vivem, e não por forças imperialistas vindas de fora. (p. 12)

Paisagem sonora, no escopo das definições desse autor, refere-se aos sons diversos, de procedências variadas, associados a um ambiente. Em um se­gundo momento, é importante viabilizar ao aluno refletir sobre os elementos sonoros que o rodeiam, para caracterizar sua pertinência na composição da paisagem sonora cotidiana.

Como consequência disso, é possível fazer uma extensão dessa caracterização de escuta crítica para investigar a situação da produção musical impos­ta pela mídia. Existe a possibilidade, também, de análise em relação aos padrões que são estabe­lecidos e ao modo como é tratada a necessidade de enquadramento nesses modelos. É necessária a diferenciação entre entretenimento e elaborações que compõem a ideologia musical. Nesse cenário, 
o filósofo e compositor alemão Theodor Adorno situa a problemática associada à estandardização.

O prazer do momento e da fachada de varie­dade transforma-se em pretexto para desobrigar o ouvinte de pensar no todo, cuja exigência está incluída na audição adequada e justa; sem gran­de oposição, o ouvinte se converte em simples comprador e consumidor passivo. (ADORNO, 2002 p. 168)

Partindo desses pressupostos, pode-se associar o conceito de problematização de Paulo Freire, para denúncia dessa estandardização e escolha pré-de­terminada em termos de indústria cultural. Nesse sentido, este trabalho, que envolve pesquisa qua­litativa e observação participante, agrega objetivos formativos associados à crítica e criatividade no que concerne aos sons em suas relações com ciên­cia, tecnologia, sociedade, ambiente e arte. Dessa forma, enfatiza-se a seguinte questão de pesquisa: 

Que possibilidades formativas podem ser identifi­cadas a partir do desenvolvimento de atividades educacionais para problematização de paisagens sonoras e música?

Nessa perspectiva, apresenta-se o delineamento de um conjunto de atividades educacionais para a problematização de paisagens sonoras e música, desenvolvidas com estudantes de curso de Licencia­tura em Física. Em caráter avaliativo de pressupostos formativos foram identificadas e analisadas as re­lações estabelecidas pelos discentes entre paisagens sonoras e música e aspectos científicos, sociais, ambientais e culturais. 

1. Paisagens sonoras

Segundo SCHAFER (2001), com o advento do cristia­nismo, houve mudanças de ênfase de percepção e a imagem de Deus passou de forma despercebida de auditiva para visual. Antigas religiões tinham como reflexo da presença de Deus, ou deuses, sons. Isto poderia ser relacionado à voz que se comunicava com os seres humanos. Poderia ainda ser associa­do aos trovões de Zeus e ao rugido dos mares de Poseidon.

O desencadeamento de formas de expressão visual trouxe, de certo modo, uma acomodação auditiva ao ser humano, ocasionando a perda de grande parte da capacidade de perceber as coisas ao seu redor a partir dos sons. Isto implicava somente observar a partir daquilo que os olhos veem.

No ocidente, o ouvido cedeu lugar ao olho, considerado uma das mais importantes fontes de informação desde a Renascença, com o desen­volvimento da imprensa e da pintura em perspec­tiva. Um dos mais evidentes testemunhos dessa mudança é o modo pelo qual imaginamos Deus. Não foi se não na Renascença que esse Deus se tornou retratável. Anteriormente ele era concebido como som ou vibração. (SCHAFER, 2001 p. 27)

Além desses aspectos, há diversos fatores sele­tivos na capacidade visual do ser humano, que faz com que aquilo que será visto seja distinguido, de modo que o indivíduo enxergue o que seja relevante naquele momento. De forma similar ocorre em ter­mos auditivos. Entretanto, na audição esse processo ocorre de maneira menos acentuada, considerando que há muito mais elementos visuais em um cenário do que sonoros. Por outro lado, a relevância des-ses componentes é tratada de forma diferenciada (SCHAFER, 2001).

A audição é o último sentido a “fechar” antes de dormir e o primeiro a “despertar” antes de acor­dar, sendo assim é o responsável por reações que possam vir a ser tomadas, de maneira automática, para preservar o organismo. Por isso, a acomodação auditiva pode ser em algumas situações prejudicial ao ser humano, quando se blinda o cérebro para um possível alerta a uma ameaça iminente, em que não haverá respostas proporcionais para o que está por vir (SCHAFER, 2001).

No escopo das considerações de SCHAFER (2001), ressalta-se que quando há demasiados sons em um ambiente específico, ou há uma convivên­cia diária com determinados níveis de ruídos, isto faz com que elementos sonoros de alertas particu­lares sejam ignorados. Por exemplo, uma pessoa que trabalha em um escritório, que fica à margem de uma via expressa onde passam ônibus, convive diariamente com os sons desses veículos. Certo dia, esse sujeito está mais distraído que o de costume, atravessa a rua e não repara na buzina do ônibus que avisa sobre perigo. A audição tem como função primitiva ser o primeiro alarme contra iminentes ameaças. Se há uma acomodação auditiva com um ambiente, dado o demasiado índice de ruídos, os indivíduos se tornam vulneráveis a riscos que ficam fora do campo de visão. Nesse sentido, relaciona-se, também, o estudo de paisagens sonoras.

Conforme SCHAFER (2001), os estudos de paisa­gens sonoras têm como principal característica uma análise de elementos que compõem os cenários. Busca-se a diferenciação em categorias, as quais possam posteriormente levar os indivíduos a uma análise do grau de relevância de cada um dos sons no dia a dia. Esse estudo pode ser associado ao que PAULO FREIRE (1970) nomeia como teorização so­bre uma dada problematização, em que um sujeito investiga todos os elementos que compõem certa conjuntura. Em seguida, examina-se a relevância de cada componente em relação ao contexto. Nesse aspecto, MONTEIRO JÚNIOR (2012) destaca:

Baseados na tese que a dialogicidade freireana é o caminho por meio do qual seres conscientes, “estando sendo” problematizadores do mundo, re­constroem-no e a si mesmos, assumimos, a priori, que as paisagens sonoras constituem um caminho de transversalidade que, nesse modo dialógico problematizador do mundo tecnológico e cultu­ral, pode revelar temas geradores por meio dos quais os licenciandos podem construir elementos conscientizadores das potencialidades da ciência e da matemática como construtoras de autono­mia e criticidade em torno da educação sonora. (MONTEIRO JÚNIOR, 2012 p. 9)

Em relação aos sons, esse processo pode ser as­sociado ao estudo de suas origens, sua evolução e o grau de influência nas situações vivenciais.

Na análise da evolução histórica visual de um ce­nário, a comparação entre fotografias com diferença de alguns anos já traz à tona uma série de mudanças que podem ser observadas. Em contrapartida, no estudo da evolução sonora de um cenário é escassa a quantidade de dados com os quais se possa fazer uma comparação. Quais eram os sons característicos de uma determinada região há 10 anos? Ou qual era a intensidade sonora de determinados ruídos?

A qualidade sonora do lugar onde se reside reflete diretamente na saúde. Um exemplo disso é a influência direta no sono. Conforme o grau de agi­tação de uma paisagem sonora que cerca o indiví­duo, o ouvido passa informações para o cérebro e 
o descanso relativo do organismo é proporcional a essa interação (SCHAFER, 2001).

Apesar dos cenários urbanos perderem gradual­mente a maioria das características primitivas, de­ve-se levar em consideração as outras espécies que convivem no mesmo ambiente. Outro problema, decorrente parcialmente da tumultuada paisagem sonora que constitui as grandes metrópoles, envolve reclamações de moradores em relação aos ruídos causados por pássaros que estão acordando mais cedo. Isso permite uma análise em duas vias: qual é a influência desses ruídos na rotina dos morado­res locais? Quais são as possíveis medidas a serem tomadas para mediar o problema? Ou, consideran­do os pássaros como foco a ser analisado, qual é a principal causa desse fenômeno?

Nessa situação, a paisagem sonora constitui par­cialmente o problema, o que demanda uma análise mais ampla e diferenciada. Esse exame envolve o estudo de paisagens sonoras e seus reflexos no ambiente. O estudo de sons característicos de cada região, que vêm sendo gradualmente suprimidos pelos sons da cidade que envolve constante mu­dança, também, representa um foco de demasiada importância.

Os sons das bateras (embarcações adaptadas com um motor de dois tempos utilizadas na ativi­dade pesqueira) da baía de Paranaguá (próxima à cidade de Curitiba), por exemplo, que podiam ser ouvidos no centro da cidade há alguns anos atrás, hoje em dia, só podem ser identificados à beira de um rio afluente, quando não há buzinas de navios que ofusquem a sonoridade das pequenas embar­cações. Esses sons eram muito característicos à po­pulação; quando os ouviam, os moradores sabiam que estava quase na hora de voltarem para casa, após o trabalho.

Essas mudanças desenfreadas nas cidades trazem reflexos na identidade cultural de um povo. O fandango, música típica do litoral do estado do Paraná, a cada dia se torna mais difícil de encon­trar. É necessário adentrar a Ilha dos Valadares (pertencente à baía de Paranaguá) de modo a res­gatar algumas raízes da música paranaense. Em contrapartida, bailes com música que estão nas mídias são encontrados em diversos lugares da re­gião. Apesar dos esforços de prefeituras em manter vivas as tradições dessa região litorânea, cada dia é mais iminente a extinção da tamanca (calçado de madeira para reprodução de sons percussivos em tablado de madeira) e da rabeca (instrumento medieval de três ou quatro cordas) que remetem ao fandango.

Logo, uma análise de elementos constituintes do cenário musical poderá trazer como resultado uma identificação de padrões impregnados que não fazem parte da cultura local, e viabilizar ao indiví­duo uma reflexão sobre suas raízes. 

2. Estudo de paisagens sonoras

Como já abordado anteriormente, a descrição de alterações de elementos de paisagens sonoras cons­tituintes de um local, que passou por demasiadas mudanças em um determinado período de tempo, possui uma defasagem muito grande no histórico de informações. Afinal, quantos decibels marcavam 
o horário de pico de trânsito na cidade de Curi­tiba na década de 1990? A memória sonora não costuma ser documentada na mesma recorrência da visual. Na maioria das vezes, ela só sobrevive nos relatos de moradores antigos, ou seja, persiste somente enquanto aqueles que a vivenciaram ali permanecerem.

Isto traz dificuldades para se estabelecer um qua­dro de evolução de tipos e intensidades de fontes sonoras com o passar dos tempos ou verificar se um ruído vindo de um advento posterior suprime seu antecessor. Por exemplo, desde quando os motores dos ônibus passaram a encobrir o canto dos pássa­ros? Assim, a caracterização de alguns elementos da paisagem sonora e seu desenvolvimento temporal apresentam informações defasadas por não existir uma cultura de registro da memória sonora.

A paisagem sonora é feita de diversos compo­nentes, os quais podem ser característicos de cada região (SCHAFER, 2001). Um pássaro que canta no Sul, uma espécie endêmica do Brasil, não necessa­riamente o faz no Norte; nem mesmo o barulho do mar de uma cidade litorânea pode ser percebido ao pé da serra. Cada componente corresponde a uma categoria, o canto dos pássaros se enquadra em sons vivos, enquanto o barulho do mar é associado à modalidade de sons da natureza.

Quando se analisa uma paisagem sonora, deve ser feita uma categorização que favoreça a análise pretendida, de modo que viabilize a pesquisa. Os sons de uma única fonte podem ser interpretados em âmbitos diferenciados. Por exemplo, o som de um músico tocando seu violão ligado em uma caixa elétrica pode ser categorizado tanto como pós-ad­vento da eletricidade quanto em relação à criação do instrumento. Caso o enfoque do estudo seja mais histórico e cultural, a classificação que se enquadra na evolução do instrumento apresenta-se interes­sante, enquanto em uma investigação voltada à relação entre o som e conhecimentos científicos, a categoria de elemento pós-advento da eletricidade seria mais adequada (SCHAFER, 2001).

A influência dos elementos constituintes de uma paisagem sonora ou a ausência desses componentes pode ocasionar determinadas reações em vizin­hanças. Moradores do campo podem sentir dificul­dades em dormir em grandes metrópoles, devido a demasiados ruídos, enquanto a quietude do campo pode incomodar alguns residentes da cidade. Mar­cos sonoros podem ser extremamente importantes para populações locais. Podem ser destacados como exemplos os casos de pessoas que moram na praia e se sentem à vontade com o barulho do mar ou moradores de tundra que se incomodam com ruí­dos que quebram o silêncio da neve. O exemplo do galo cantando pela manhã virou uma ilustração de acordar cedo para quem vive em uma fazenda ou da rotina no campo.

Nesse sentido, destaca-se a problematização de paisagens sonoras, com a análise de seus elemen­tos característicos que influenciam diretamente na realidade vivencial de comunidades. Esse estudo pode ser associado à formação cultural no âmbito educativo. 

3. Indústria cultural

Nesse processo de problematização de paisagens sonoras e música se relaciona a indústria cultural, que se refere a um termo que foi explicitado pelo filósofo alemão Theodor Adorno em referência a um modo lógico de se fazer cultura a partir de uma perspectiva industrial. O cinema é um exemplo muito usual para o caso, um filme que almeja al­cançar um grande grupo de pessoas tem que fazer com que aquele que o está assistindo busque uma identidade em algum personagem. Então, criam-se padrões de personagens e tramas, além da própria produção em si, de modo que quando se tem uma obra que faz sucesso, logo essa lógica por trás da tela é copiada e inserida com alguns elementos di­ferentes em contextos da realidade vivencial.

A suspeita de antigos críticos culturais se con­firmou: em um mundo onde a educação é um privilégio e o aprisionamento da consciência nos impede de toda maneira o acesso das massas a experiências autênticas das formações espirituais, já não importam tanto os conteúdos ideológi­cos específicos, mas o fato de que simplesmente haja algo preenchendo o vácuo da consciência expropriada e desviando a atenção do segredo conhecido por todos. No contexto de seu efeito social, é talvez menos importante saber quais as doutrinas ideológicas específicas que um filme sugere aos seus espectadores do que o fato de que estes, ao voltar pra casa, estão mais interessa­dos nos nomes dos atores e seus casos amorosos. (ADORNO, 2002 p. 94)

Como consequência direta desse processo de pa­dronização, o modo de criação, e toda a liberdade que demanda, acaba sendo limitado, uma vez que o sujeito não tem poder de escolha, os padrões se repetem, pois já se comprovaram uma fonte ren­tável de lucro com o passar do tempo. A partir do momento que grandes massas adotam esses mo­delos, que são proliferados pela indústria cultural, cria-se uma grande crise de autenticidade, na qual indivíduos que busquem características únicas são tratados de maneira preconceituosa por aqueles que têm a necessidade de estar na “moda”.

Ao mesmo tempo que a indústria cultural convida a uma identificação ingênua, logo e prontamente ela é desmentida. A ninguém mais é lícito esquecê-lo. Anteriormente, o espectador do filme via as próprias bodas nas bodas do outro. Agora os felizes no filme são exemplares perten­centes à mesma espécie de cada um que forma o público, mas nessa igualdade é colocada a in­superável separação dos elementos humanos. A perfeita semelhança é a absoluta diferença. A identidade da espécie proíbe a dos casos. A indústria cultural perfidamente idealizou o homem como ser genérico. Cada um é apenas aquilo que qualquer outro pode substituir: Coisa fungível, um exemplar. (ADORNO, 2002 p. 42-43)

Nesse sentido, cabe situar a música. Ela serve como panorama para diversos momentos da vida, agregan­do a busca de fundo musical para atividades ou cir­cunstâncias do cotidiano. “A música forma o melhor registro permanente de sons do passado. Assim, ela será útil como um guia para modificações nos hábitos e nas percepções auditivas” (SCHAFER, 2001 p. 151).

Como uma forma única, cultural e emocional, a música não fica de fora dos olhares da indústria. A partir da afirmação de que são associados muitos momentos com o que se ouve, o domínio industrial busca padrões que trazem soluções prontas para 
o sujeito, dadas as situações que interessam para o lucro. Assim, a busca por novas experiências se torna algo fora da realidade para aqueles que se identificam com esses modelos impostos. 

O estudo de paisagens sonoras se alia a uma visão crítica da indústria cultural, em seu envolvi­mento com a música, viabilizando elementos de reflexão. A partir do desenvolvimento da capacidade auditiva de uma maneira mais crítica, o estudo das paisagens sonoras pode propiciar a reflexão sobre aquilo que chega aos ouvidos.

Isto pode viabilizar ao indivíduo refletir sobre o contexto no qual está inserido, de identificação e crítica de padrões impostos pela indústria cultural, de modo a se tornar o protagonista das suas próprias escolhas, influenciadas ou não pela indústria cultu­ral. Ele passa a criar novas experiências, ao invés de reproduzir aquilo que lhe é exposto: “quanto mais o todo é despojado de seus elementos espontâneos e socialmente mediado e filtrado, quanto mais ele é ‘consciência’, tanto mais se torna ‘cultura’” (ADOR­NO, 2002 p. 95). 

4. Aprendizagem

A problematização de paisagens sonoras e de mú­sica, ainda, relaciona-se à apropriação linguística e conceitual. Nesse sentido, podem ser associa­dos pressupostos de aprendizagem significativa, que remete ao estabelecimento de relações entre conteúdos já apropriados e novos conhecimentos. Nessa perspectiva são delineadas as modalidades de aprendizagem representacional (elementos repre­sentacionais), proposicional (estruturas expressivas) e conceitual. Em relação à vertente conceitual, si­tuam-se os processos de formação e assimilação de conceitos (AUSUBEL, NOVAK, HANESIAN, 1980).

Formação de conceitos se refere às ações de agrupamento de aspectos semelhantes em direciona­mento de generalização. Ressalta-se, nesse sentido, o domínio empírico-concreto com a viabilização de possibilidades de estabelecimento de relações envolvendo perspectivas contextuais. No caso da assimilação, salientam-se as conexões entre con­ceitos em um quadro teórico específico (AUSUBEL, NOVAK, HANESIAN, 1980).

Neste trabalho, a problematização de paisagens sonoras e música envolve a disponibilização de elementos para o estabelecimento de relações con­cernentes, particularmente, a conteúdos de Física, tanto em termos de aspectos contextuais, quanto de associações entre conceitos de um quadro teórico específico, agregando fatores representacionais e proposicionais. 

5. Metodologia

Este trabalho envolve pesquisa qualitativa (FLICK, 2009) com observação participante e imersão no ambiente de investigação. Desse modo, houve in­teração entre todos os sujeitos, em análise e cate­gorização dos elementos constituintes da paisagem sonora e aspectos musicais do contexto dos parti­cipantes. Os dados foram constituídos por meio de registros escritos em diário de campo, gravações de áudio e produções escritas dos estudantes e analisa­dos conforme Análise de Conteúdo (BARDIN, 2011).

As ações educativas agregaram a oficina de aprendizagem denominada “Física, Música, Socie­dade e Meio Ambiente”, direcionada a estudantes de curso de Licenciatura em Física de instituição de Ensino Superior, porém aberta para o público em geral, desenvolvida no primeiro semestre de 2016. O grupo participante foi composto por nove alunos: sete do curso de Licenciatura em Física, dos quais três encontravam-se matriculados à época no pri­meiro semestre, dois no quarto e dois no sétimo (o referido curso envolve oito semestres); um aluno de curso Técnico em Radiologia da mesma instituição de realização da pesquisa; e um aluno de Medicina de outra instituição.

Essa oficina de aprendizagem envolveu a verifi­cação e o desenvolvimento da capacidade auditiva dos indivíduos. Após verificarem a caracterização de uma paisagem sonora, os alunos foram desafiados a observar de maneira problematizadora o contex­to da instituição de Ensino Superior e a proporem alternativas para problemas que eles constataram. Por fim, os alunos foram levados a uma discussão sobre o cenário musical contemporâneo brasileiro, uma vez que eles haviam vivenciado um processo de análise crítica de elementos sonoros.

As competências desenvolvidas pelos alunos, com relação à proposta de SCHAFER (2001), simul­taneamente aos pressupostos de ADORNO (2002), envolveram: compreensão de fenômenos naturais, culturais e artísticos; apropriação e utilização de conhecimentos de Física; análise, síntese e inter­pretação de sons, fatos e situações.

Essas competências se referem ao desenvolvi­mento de um ouvido pensante com o estudo de pai­sagens sonoras, atividades de escuta diferenciadas e utilização desses aspectos para uma análise crítica do cenário musical brasileiro e relações com a in­dústria cultural. Essa oficina envolveu as atividades educacionais apresentadas na Tabela 1, a seguir. 

As atividades educacionais desenvolvidas com­preenderam quatro encontros, cada um com cem minutos (duas horas-aula), totalizando quatrocen­tos minutos (oito horas-aula), com abordagem de temática envolvendo paisagens sonoras, música e indústria cultural.

O Encontro 1 teve como enfoque a análise e o desenvolvimento da capacidade e memória auditiva. Para isso, foram selecionados exercícios de escuta, memória e criação de sons, baseados em SCHAFER (2009). Dessa forma, verificou-se a capacidade de discernimento de características físicas diante dos conhecimentos prévios dos participantes, reconheci­mento de sons, com base em relação entre audição e outros sentidos, memória auditiva, lembranças de experiências antigas em associação com atuais cotidianas.

Nesse âmbito, destacam-se dois exercícios en­volvendo características do som, frequência e in­tensidade sonora. Desenvolveu-se, ainda, exercício relacionado ao reconhecimento de sons vinculados ao contexto dos sujeitos. Em relação à memória auditiva ressaltam-se quatro questões, as quais en­volviam “marcos sonoros” (referentes ao cotidiano dos participantes e suas infâncias).

No Encontro 2, os participantes tiveram contato com a adequação da metodologia de classificação de fontes sonoras de SCHAFER (2001), explicitada na análise de dados. Nesse momento, foi apresentada a caracterização da paisagem sonora da região por­tuária de Paranaguá. Isso viabilizou aos discentes o estudo direcionado do caso da instituição de En-sino Superior, com a escolha de duas regiões peri­féricas. Divididos em duas equipes e munidos de decibelímetros, os alunos selecionaram as fontes de reprodução sonora a serem analisadas e mediram os índices de intensidade sonora. Após os dados coletados, eles elaboraram ilustrações posicionando cada componente em esquemas e foram discutidas possíveis implicações à saúde e soluções aos pro­blemas evidenciados.

O Encontro 3 se iniciou com uma revisão dos conceitos de ondulatória, seguida de abordagem das propriedades do som com um enfoque diferenciado, pois foram priorizadas grandezas de maior impor­tância para a música. A segunda parte do encontro trouxe para os participantes temas como frequência fundamental, frequências associadas a instrumentos, formação de acordes e campos harmônicos.

Essa aula teve o intuito de trazer aos alunos a concepção que música é algo “pensado” e com uma progressão lógica, mesmo levando em consideração a criatividade dos músicos no que concerne às possi­bilidades que vêm na produção e execução de uma canção. Foi abordada a questão de que música não corresponde a formatos pré-definidos, a considerar, por exemplo, que um acorde tem diversas configu­rações associadas às notas que o descrevem. 

No Encontro 4, foram apresentadas aos alunos músicas que estavam no topo nas mídias brasileiras à época, questionando-os com relação às caracte­rísticas das mesmas. Foi mostrada aos discentes a evolução do cenário musical mundial em contraste à tendência brasileira da mesma época.

Após a apresentação da concepção de indús­tria cultural proposta por Theodor Adorno e Max Horkheimer em um ensaio denominado “Indústria Cultural: o esclarecimento como mistificação das massas”, da década de 1940 (ADORNO, 2002), apresentou-se uma entrevista feita com produtor mu­sical, músico e proprietário de um estúdio na cidade de Paranaguá, com mais de 18 anos de atuação. Ele abordou a questão das características da produção das músicas que almejam alcançar o mercado mu­sical. Por fim, os alunos refletiram sobre a presença e a influência da indústria cultural nas suas vidas. 

6. Análise de dados

No processo de análise de dados foram seleciona­das unidades de contexto, em que se evidenciou o estabelecimento de relações entre conhecimentos científicos e aspectos sociais, culturais e ambientais. Para atender a essas expectativas, foram estabele­cidos quatro eixos: I. Verificação de percepção de conceitos físicos; II. Desenvolvimento de percepção e memória auditiva; III. Estudo de paisagens sono­ras; IV. Aprendizagem de conteúdos de Física com estudo de paisagens sonoras e música; V. Relações estabelecidas sobre música e indústria cultural.

Na apresentação dos dados, as equipes foram designadas como A e B. No caso das produções individuais, os alunos foram designados com a letra A seguida de número (exemplo A1, A2, ... , An).

a. Verificação de percepção de conceitos físicos

No que concerne ao eixo I: verificação de percepção de conceitos físicos, os conhecimentos de Física foram averiguados em dois momentos. Primeiro, no Encontro 1, verificou-se a capacidade de dis­cernimento dos participantes entre sons agudos e graves, considerando a frequência, e sons fortes ou fracos, em relação à intensidade sonora, conforme proposto por SCHAFER (2001).

Nesse sentido, foram apresentados quatro sons aos alunos: (1) zumbido das asas de uma abelha; 
(2) trovão; (3) violino tocando; (4) mugido de uma vaca. Em termos de frequência, os alunos apresen­taram dificuldades em associar o som reproduzido em aula com aquele encontrado na natureza, houve exceção apenas no caso do trovão. No que concerne à intensidade sonora, pode-se observar maior índice de acertos. Contudo, ficou evidente que há certa tendência dos estudantes em confundir frequência e intensidade.

No segundo momento, no Encontro 3, reali­zou-se uma revisão no estudo de ondas sonoras e suas características fundamentais, com enfoque diferenciado sobre dois conceitos relevantes no estudo da acústica: frequência e intensidade so­nora. Foi possível observar que apesar de terem conhecimentos sobre a temática, os alunos do curso de Licenciatura em Física, em sua maioria, têm dificuldades no reconhecimento de diferentes tipos de sons, quando se leva em consideração as referidas grandezas. Um aspecto relevante a ser considerado é a interferência da psicoacústica nos resultados, uma vez que a forma de decodificação de sons é feita diferentemente em cada organismo (SCHAFER, 2001). 

b. Desenvolvimento de percepção e memiaauditiva

Em relação ao eixo II: desenvolvimento de per­cepção e memória auditiva, no Encontro I, alguns exercícios e questionamentos foram realizados, ba­seados na metodologia de SCHAFER (2009). Esse autor apresenta 100 exercícios de escuta e criação de sons, os quais envolvem desenvolvimento da capacidade auditiva e de criação, assim como me­mória sonora.

Nesse sentido, destaca-se exercício associado ao reconhecimento de sons corriqueiros, com resulta­dos apresentados na Tabela 2. 

Ao analisar os resultados apresentados na Tabela 2, é possível observar que quase todos os partici­pantes acertaram o resultado para os sons 1 e 3. Isso pode associar-se ao fato de que eles provavelmente entram em contato esses produtos com regularida­de. Para SCHAFER (2001), há um grande número de informações sobre objetos, como peso, textura, aspectos visuais, sendo que a audição não é necessa­riamente a principal fonte provedora dessas noções.

No caso do som 4, em que houve somente um acerto, salienta-se que a água remete a característi­cas físicas e sonoras distintas conforme o local por onde ela está carreando. Provavelmente os alunos não visitam com regularidade um ambiente onde haja uma cachoeira. Por outro lado, podem frequen­temente presenciar a chuva ou o mar.

No que concerne aos questionamentos realiza­dos, estes envolveram “marcos sonoros”. Uma das questões abordadas foi: “qual o último som que você escuta antes de dormir?”. Os alunos A1, A2 e A8 citaram o ventilador; A3 destacou a respiração; A4 e A7 comentaram sobre cachorros; A5 ressaltou carrinhos de supermercado; A6 e A9 mencionaram trânsito. Pode-se observar que todos os participantes afirmaram dormir ao som de objetos que são de uso comum da casa ou barulhos externos.

Outra questão abordada foi: “qual o som mais bonito do seu dia?”. A resposta dos entrevistados para esta indagação foi quase unânime: música. Nesse contexto, destaca-se, ainda, a seguinte per­gunta realizada: “qual a experiência sonora que mais te marcou em toda vida?”. Nas respostas, música, novamente, foi descrita como um marco sonoro importante, representando associação com marcos de vidas (SCHAFER, 2001).

Ao analisar os resultados obtidos nesse eixo II, nota-se que os participantes têm a sua memória auditiva ligada a demais sentidos, principalmente a visão. O único exercício de percepção sonora que os participantes praticam diariamente tem en­volvimento direto com a música. Logo não é de se estranhar que os envolvimentos da memória acústica deles estejam associados à música. 

c. Estudo de paisagens sonoras

Em relação ao eixo III: estudo de paisagens sono­ras, no Encontro 2, aos participantes foi proposto o estudo de caso de um cenário comum a todos, da instituição de Ensino Superior vinculada à pesquisa e suas imediações. Com base na metodologia de SCHAFER (2001), os alunos foram a campo para fazer análise dos elementos e informações encon­trados de modo a realizar uma caracterização desse contexto. 

Identificação de elementos da Paisagem Sonora

Com o objetivo de realizar uma adaptação da me­todologia de SCHAFER (2001), que pudesse atender aos requisitos da pesquisa, a turma foi dividida em duas equipes, A e B, ambas munidos de decibelí­metro. Durante a aula foram fornecidas as devi­das instruções de manuseio desse equipamento, baseadas em seu manual, de modo que os alunos conseguissem fazer de maneira mais exata possível as medições.

Como a universidade ocupa um espaço signifi­cativamente grande, os alunos se posicionaram em duas diferentes esquinas perimetrais à instituição, a equipe A nas proximidades de um posto de combus­tíveis e a equipe B próxima a um Shopping Center. É interessante salientar que não foi feita a escol­ha de nenhuma área interior na universidade, mas em lado exterior, pelo fato de que há o restaurante universitário, uma área semiaberta de uso comum à comunidade em geral, cujo ruído emitido pela conversa interferiria nas medições realizadas.

Solicitou-se aos alunos que fizessem uma ilus­tração da paisagem sonora observada e detalha­mentos das fontes emissoras de som analisadas. Por exemplo, os alunos da Equipe A salientaram cinco elementos a serem examinados: carros; fiações elé­tricas; ônibus; pessoas; vento. Os discentes relata­ram que na rua há um intenso tráfego de ônibus e carros, uma vez que essa via tem sentido do centro para os bairros e devido ao horário, entre oito e nove horas da noite, em que foram realizadas as medições e análises. 

Coleta de dados de intensidades sonoras

Nessa etapa, ao identificar elementos produtores de som, os alunos utilizaram um decibelímetro, para aferir os valores de intensidade sonora emitida pelas fontes. Os discentes tomaram as devidas precauções para utilizar o aparelho de maneira correta, uma vez que a rua envolvida nas ações é um eixo de ligação entre bairros, além de estar cercada por prédios no local onde se realizaram as medições supracitadas e apresentar uma corrente de vento de intensidade moderada a forte na ocasião. Sendo assim, eles utilizaram um acessório, que vinha com o kit do equipamento, para que não houvesse gran­de influência nas mensurações diante dos fatores ambientais detectados. 

Vale salientar que os participantes foram orienta­dos a fazer o maior número possível de medições, para gerar uma média e torná-la mais precisa. Dado o curto espaço de tempo disponível para a realização da oficina, associado ao fato de vários alunos serem novatos do curso de Licenciatura em Física, não foi solicitado nenhum tratamento de erros, sendo requerida somente uma média ponderada para ob­tenção dos valores. 

De acordo com PIMENTEL-SOUZA (2000) e le­vando-se em conta os valores apresentados pelos estudantes, foi possível afirmar que ambos os am­bientes são de risco à audição. Em caso de longa exposição a sons dessas intensidades, o organismo tolera no máximo oito horas. A partir disso, este fica sujeito a estresse degenerativo, além de abalo à saúde mental. 

Caracterização de elementos de paisagem sonora

Nessa etapa os alunos classificaram cada uma das fontes sonoras, utilizando a metodologia de SCHA­FER (2001), adaptada para essa oficina. Essa cate­gorização envolve duas variáveis: natureza da fonte de reprodução e frequência do evento.

Em termos de natureza da fonte, podem ser elencadas as modalidades associadas a: natureza; animais; tecnológicos. Por exemplo, a Equipe A re­lacionou o vento a “natureza”; pessoas a “animais”; fiações elétricas e carros (e ônibus) a “tecnológi­co”. No que concerne à frequência de ocorrência do fenômeno sonoro, apresenta-se classificação como: contínua; repetitiva; única. A referida equipe associou carros (e ônibus) a caráter “repetitivo”; os demais componentes foram compreendidos como “contínuo”.

Dessa maneira, os alunos fizeram uma classifi­cação das fontes de reprodução identificadas em cada paisagem sonora. As equipes não tiveram di­ficuldades em fazer essa categorização, que lhes permitiu levantar questionamentos com relação à influência da expansão das aglomerações urbanas, o que as impele ao incremento de extenuantes ex­posições a sons e ruídos. A partir disso, iniciou-se a etapa de apontamentos de sugestões para mudanças nesses cenários analisados. 

Soluções e reflexões sobre a influência da paisagem sonora

A partir de todas as análises feitas em observação direta pelos participantes, nas etapas anteriores, eles realizaram discussões e proposições sobre a temática. Os estudantes, contudo, apresentaram sugestões de mudanças superficiais considerando a complexidade da situação, direcionadas meramente a “arrumar” alguns componentes do cenário.

Nesse sentido, nota-se que os discentes não rele­vam a importância da qualidade de uma paisagem sonora. Provavelmente, quando eles andam em meio ao caos urbano, utilizam algum dispositivo de fuga desse emaranhado sonoro.

Quando questionados com relação à frequência do uso de fones de ouvido, todos afirmaram que usam esses equipamentos enquanto passam pelo centro da cidade e em casa. Se não estão com esses equipamentos, estão com algum aparelho reprodu­tor sonoro ligado, de modo que não percebem o som ao seu redor. 

d. Aprendizagem de conteos de Física com estudo de paisagens sonoras e mica

Em relação ao eixo IV: aprendizagem de conteúdos de Física com estudo de paisagens sonoras e mú­sica, viabilizou-se a abordagem de conhecimentos atrelados a acústica, ampliando a disponibilização de aspectos contextuais para estabelecimento de relações. Dessa forma, “ondas” que poderiam es­tar apenas representadas em desenhos nos quadros negros, associadas a equações e valores numéricos, foram relacionadas a sons que permeavam cenários sonoros e panorama musical no domínio da reali­dade vivencial dos participantes.

Nesse contexto, foram abordados: intensidade so­nora, período, reflexão, refração, timbre, frequência e ressonância. A análise de indícios de aprendiza­gem de conteúdos de Física, no processo viven-ciado, reporta-se ao estabelecimento de relações, pelos participantes, envolvendo aspectos contex­tuais e conceitos estabilizados em domínio cientí­fico, conforme proposições de AUSUBEL, NOVAK, HANESIAN (1980). Destacam-se, nesse sentido, as atividades de estudo e caracterização de paisagens sonoras e relacionadas à música.

No estudo de paisagens sonoras, no Encontro 2, os participantes, utilizando o decibelímetro, medi­ram valores de intensidade sonora provenientes de diversas fontes, evidenciando a presença do som e período. Concernente aos níveis de intensidade sonora, na Tabela 3, apresentam-se alguns valores verificados pelos participantes da equipe A.

Os participantes reconheceram valores e asso­ciaram o conteúdo de intensidade sonora a aspectos contextuais; apresentaram indícios de apropriação linguístico-conceitual, também, na elaboração de proposições de alternativas envolvendo aspectos da paisagem sonora, embora possam ser apontadas limitações dessas ações propositivas. No processo de caracterização da paisagem sonora, foi possível verificar fenômenos ondulatórios em relação à re­fração e à reflexão.

Nas ações de problematização e análise de as­pectos musicais, no Encontro 3, os participantes puderam verificar características de frequência ao estudarem instrumentos musicais. Paralelamente a isso, foram utilizados exemplares de vozes para caracterizar diferenças envolvendo timbre. Em re­lação à ressonância, foram feitos testes de afinação, utilizando um afinador e um simulador de teclado.

Nesses testes, houve abordagem de frequência, timbre e fenômeno da ressonância, que ocorria quando se atingiam as mesmas notas no simula­dor. Nessas atividades envolvendo música, houve indícios de aprendizagem concernentes ao estabe­lecimento de relações entre conteúdos de Física e aspectos contextuais. Entretanto, foram identificadas algumas limitações em termos de aprendizagem no que se refere ao aprofundamento das associações envolvendo conhecimentos estabilizados em do­mínio científico. 

e. Relações estabelecidas sobre música e indústria cultural

Em relação ao eixo V: relações estabelecidas sobre música e indústria cultural, no Encontro 4, espera­va-se que os alunos já tivessem desenvolvidas suas capacidades auditivas, no que tange ao aumento da percepção de sons. Esperava-se que pudessem visualizar um cenário sonoro, seja em uma paisa­gem, uma música ou qualquer tipo de ambiente onde estivesse uma fonte reprodutora presente, de maneira mais ampla, levando todos os elementos em consideração e distinguindo características físicas e antropológicas, sociais e culturais.

Então, nesse encontro, foi iniciado diálogo levan­tando questionamentos aos alunos sobre os estilos musicais que dominavam o cenário brasileiro. A resposta foi unânime, o Sertanejo Universitário e o Funk Brasileiro. Após, indagados se alguns desses estilos os agradavam, somente os alunos A5 e A2 se manifestaram a favor, porém ambos acrescentaram 
o fato de os ouvirem apenas em casas de show.

Ao serem questionados sobre o motivo pelo qual a maioria não gostava desses gêneros musicais, hou­ve somente a manifestação de dois alunos: “eu não gosto desses estilos pelo simples fato de as letras serem muito parecidas em micas diferentes. As letras não agregam nada às pessoas e muito pobre culturalmente se falando” (Aluno A9).    

Outro aluno complementou a resposta articulan­do: “sem contar que elas são muito preconceituo­sas com alguns estereipos. O que mais me deixa irritada é que elas sempre vulgarizam a mulher” (Aluno A3).

Em um segundo momento, os alunos foram in­dagados sobre aspectos de constituição de músicas, se eles achavam que eram boas ou ruins. Todos os alunos responderam negativamente, afirmando que também eram mal produzidas.

Então, logo após a articulação em relação à pro­dução musical e a indústria cultural, os alunos res­ponderam, por escrito, a três perguntas.

O primeiro questionamento entregue foi: “Qual o impacto da indústria cultural na sociedade?”.

A maioria dos alunos trouxe respostas similares, afirmando que a indústria cultural dita valores vin­culados à moda, música e estilo de vida. Porém, três respostas se destacaram.

Afunilamento, que acaba por nos mostrar uma su­perficialidade que não nos deixa criar um senso crítico sobre tudo o que nos cerca, como a música, além de gerar um “modelo específico” do que é considerado “bom”. (Aluno A6)

A indústria cultural influencia na arte, política e educação, na sociedade como um todo. A indústria cultural cria tendências e inibe a formação de opiniões próprias. Em suma, a mídia dita o que será consumi­do, comportamentos e, de certa forma, o gosto de alguns. (Aluno A9)

A indústria cultural molda a sociedade no sistema capitalista, pois as músicas populares descrevem uma realidade que as pessoas ideais são as que têm maior poder de compra. Essas músicas são muito difundidas encobrindo uma realidade de desigualdade social e exploração, como a música é uma atividade de lazer para uma grande maioria, a indústria cultural não con­tribui em nada para que o indivíduo reflita, só ajuda na reprodução do sistema. (Aluno A2)

As respostas explicitadas por esses três participan­tes remetem a possibilidades formativas no trabalho desenvolvido. Destaca-se situação em que indiví­duos, que não têm participação em movimentos cul­turais, adquirem uma capacidade de discernimento auditivo maior, em relação a momento anterior ao curso. Essas expressões remetem a indícios de des­envolvimento de senso crítico da realidade ao seu redor e das influências a que estão sujeitos. No que diz respeito a um licenciando em Física, essa forma de pensar criticamente pode influenciar sua maneira de ensinar, não sendo meramente um trans­missor, mas um ser atuante no contexto educativo. Isso pode ser associado à concepção educacional dialógico-problematizadora freiriana. Além disso, esse senso crítico leva a um contraste em relação às ideologias que são impostas (ADORNO, 2002).

A partir desse ponto, foi possível levantar o se­gundo questionamento: “Qual impacto da indústria cultural em sua vida?”.

Grande parte dos alunos simplesmente apre­senta a resposta a esse item como se fosse parte da indagação anterior, caracterizando a influência da indústria cultural como algo que dita questões como moda, música e estilo de vida. Destacam-se, a seguir, as afirmações de quatro alunos.

“A indústria cultural está em praticamente tudo, não há maneiras de fugir de influência. Por mais que eu não seja influenciado pela indústria atual, eu com certeza sou influenciado por uma anterior ou serei por uma futura” (Aluno A4). Apesar de não se pre­ocupar com aquilo que é imposto hoje, o aluno A4 expressou que se adaptou com elementos advindos de ritmos ditados anteriormente em domínio indus­trial e se mostrou aberto a incorporar fatores que possam vir em futuras tendências. Isso retrata uma realidade em que o indivíduo se adapta a tudo que há ao seu redor e seleciona aquilo que ele deseja (ADORNO, 2002). Salienta-se, contudo, que a partir do momento que haja espontaneidade do sujeito para escolher as experiências pelas quais ele vai ser influenciado, amplia-se a sua independência em relação à indústria cultural.

O Aluno A7 traz um retrato sobre o qual se pode notar que a mídia o influencia de uma maneira di­ferente, mas ainda retrata uma realidade um tanto quanto comum. “Músicas com conteúdo ou melo­dia não muito agradável ao meu ‘estado de espírito’ acabo por acostumar com a mica pela repetição que se toca na mídia” (Aluno A7). Esse discente traz um retrato muito habitual contemporaneamen­te, quando a repetição dos meios de vinculação de informações “vence pelo cansaço”. Apesar de limitação da resposta somente ao meio musical, esse é um retrato diário do que ocorre com muitos indivíduos em áreas distintas.

A seguir são apresentadas as respostas dos alunos A3 e A2, com o reconhecimento de influências da indústria cultural. “Ela torna mais difícil conhecer novas opções e nos faz ter um senso crítico fraco, pois temos um conhecimento leve, ou não aprofun­dado, sobre diversos temas” (Aluno A3)

Como somos resultados do que vemos, ouvimos e nossas experiências em geral, a indtria cultural tem impacto direto na vida de todos. Esse impacto pode ser identificado na minha vida pelo o que eu consi­dero importante e básico para viver, que certamente é influenciado pela indústria cultural. (Aluno A2)

Nesse sentido, ressalta-se que a individualida­de do homem é algo que a indústria cultural tenta combater, há sempre padrões de identidades como metas de vida (ADORNO, 2002).

Quando questionados em como seria possível minimizar os impactos dessa influência, destaca-se a resposta do Aluno A9: “A educação desde a infân­cia. A formação de cidadãos pensantes tende a inibir o surgimento de indivíduos que não analisam suas escolhas. Gera pessoas que sabem o que querem consumir, diferente daqueles que apenas repro­duzem a tendência das grandes massas” (Aluno A9).

Isso reflete uma das principais motivações deste trabalho, seguindo em paralelo com a dialogicidade freiriana (FREIRE, 1970). Ressalta-se, nessa direção, a perspectiva de Theodor Adorno de enfrentamen­to das limitações impostas pelas formas de pensar disseminadas pela indústria cultural, perpassando os processos formativos e educativos. 

7. Considerações finais

A audição não possui apenas aspectos físicos, fisio­lógicos e sensoriais, como também atua na forma como os indivíduos se relacionam entre si e com o ambiente em que estão inseridos. Nesse sentido, a compreensão de paisagens sonoras, de música e de conhecimentos acerca das características físicas dos sons (acústica) torna-se relevante.

Durante a pesquisa, realizou-se o diagnóstico a respeito do reconhecimento de tais propriedades por estudantes de curso de Licenciatura em Física. O perfil traçado, após o desenvolvimento dos exer­cícios explicitados, demonstrou que os licenciandos participantes apresentaram dificuldades na distinção entre frequência e intensidade sonora. A análise de frequência considerando elementos musicais também demonstrou um déficit por parte dos participantes.

Contudo, podem ser apontadas possibilidades associadas à aprendizagem de conteúdos de Física, considerando o estabelecimento de relações entre conceitos físicos e aspectos contextuais, viabilizado pela problematização de paisagens sonoras e músi­ca. Nesse sentido, destacam-se aspectos musicais, que se relacionavam aos interesses dos participantes. Ressalta-se, ainda, a atividade de reconhecimento da paisagem sonora em espaço familiar aos sujeitos, que viabilizou a mobilização de aspectos de inte­resse e elementos para estabelecimento de relações.

Além dos conceitos físicos, buscou-se realizar um estudo sobre a percepção auditiva dos participantes. A relação entre audição e outros sentidos foi anali­sada através de exercícios com sons do cotidiano, demonstrando a estreita ligação entre audição e visão. Outro aspecto levantado, condizente com a percepção auditiva dos indivíduos, referiu-se à for­ma e às situações nas quais os sons estão presentes no seu cotidiano.

Com relação ao estudo de paisagens sonoras, os estudantes foram divididos em duas equipes para fazer o esboço dos elementos sonoros, a aferição das intensidades sonoras e classificação de tais fa­tores a partir da natureza da fonte de reprodução e a frequência do evento. Os dois grupos obtiveram êxito nessa etapa, o que demonstra sua familiari­dade com paisagens sonoras urbanas. No entanto, apesar dos resultados promissores para esse aspecto, os licenciandos demonstraram pouca profundidade teórica na proposição de medidas mitigadoras para as fontes de poluição sonora apontadas no estudo desses cenários.

Por fim, buscou-se uma discussão sobre as re­lações entre: música, indústria cultural e qualida­de musical. O interessante foi que a capacidade de diferenciação de aspectos musicais e culturais foi ampliada no decorrer das discussões. Por outro lado, a visão dos estudantes sobre indústria cul­tural predomina em uma associação direta com influência do capitalismo, ignorando, contudo, as­pectos sociais, políticos e culturais. Pode-se salientar como aspecto positivo a apropriação do conceito de produção musical como um produto final com padrões pré-estabelecidos; muitos alunos trouxeram a entrevista com o produtor musical como muito esclarecedora nesse aspecto.

Ao final do desenvolvimento da oficina “Física, Música, Sociedade e Meio Ambiente” conclui-se que é viável e possível elaborar atividades educa­cionais diferenciadas no ensino de ondulatória e acústica. Porém, é necessário mais tempo, tanto de aula como de preparo de recursos didáticos. A elaboração de um material didático feito aos mol­des da oficina se torna uma opção muito atrativa, principalmente no que diz respeito ao conteúdo de teoria musical.

Conclui-se que o objetivo foi alcançado par­cialmente, uma vez que os dados obtidos abriram novas possibilidades de abordagem para que em uma futura pesquisa se viabilize a obtenção dos resultados almejados. Os encaminhamentos dos problemas de pesquisa se deram de maneira satis­fatória. Um ponto chave para o desenvolvimento de uma oficina similar ou da transposição dessas ações seria a elaboração de um formulário ou en­trevista que propicie conhecer a fundo o perfil dos participantes, de modo que haja mais profundidade e significância desse trabalho a eles. Como possibili­dades de estudos futuros, apresenta-se a questão da transposição dessas atividades educacionais para o Ensino Médio brasileiro. Destaca-se, nesse sentido, que a capacitação dos licenciandos em Física se faz necessária para que haja essa interação com alunos do ensino regular. 


8. Referências Bibliográficas

ADORNO, T. Indtria Cultural e Sociedade. 2 ed. Editora Paz e Terra. São Paulo: Brasil. 2002.

AUSUBEL, D.P.; NOVAK, J.D.; HANESIAN, H. Psi­cologia educacional. Editora Interamericana. Rio de Janeiro: Brasil. 1980.

BARDIN, L. Análise de conteo. Edições 70. São Paulo: Brasil. 2011. FLICK, U. Introdução à pesquisa qualitativa. Tra­duzido por: COSTA, J. E. 3 ed. Editora Artmed. Porto Alegre: Brasil. 2009.

FREIRE, P. Pedagogia do oprimido. 17 ed. Editora Paz e Terra. Rio de Janeiro: Brasil. 1970.

MONTEIRO JÚNIOR, F.N. Educação Sonora: Encon­tro entre ciências, tecnologia e cultura. 315 p. Programa de Pós-Graduação em Educação para a Ciência, Doutorado em Educação para a Ciência – Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, Bauru, 2012. Disponível em <http://repositorio.unesp.br/bitstream/handle/11449/102066/ monteirojunior_fn_dr_bauru.pdf?sequence=1&isAllowed=y>. Acesso em: 13, set., 2018.

PIMENTEL-SOUZA, F. Efeito do ruído no homem dormindo e acordado. In: ENCONTRO DA SO­CIEDADE BRASILEIRA DE ACÚSTICA EM SIM­PÓSIO INTERNACIONAL, 19, Belo Horizonte. Anais eletrônicos... XIX ESBA. Meio digital. 2000. Disponível em <http://labs.icb.ufmg.br/lpf/pimentel,sobrac2000.html>. Acesso em: 13, set., 2018.

SCHAFER, R.M. A Afinação do Mundo. Uma ex­ploração pioneira pela histia passada e pelo atual estado do mais negligenciado aspecto do nosso ambiente: A paisagem sonora. Traduzido por: FONTERRADA, M. T. O. Editora UNESP. São Paulo: Brasil. 2001.

SCHAFER, R.M. Educação sonora: 100 exercícios de escuta e criação de sons. Traduzido por: FONTERRADA, M.T.O. Editora Melhoramentos. São Paulo: Brasil. 2009. 

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