Um estudo da relação entre as imagens mentais utilizadas por estudantes de mecânica quântica e seu perfil epistemológico: uma investigação pela metodologia report aloud

Study on the relationship between mental images and the epistemological profile of quantum mechanics students: an investigation using the report aloud methodology

Autores/as

  • Robson Trevisan Universidade Luterana do Brasil
  • Agostinho Serrano de Andrade Neto Universidade Luterana do Brasil

Palabras clave:

Epistemological Profile, Physics Teaching, Quantum Mechanics, Cognitive Mediation Networks Theory (en).

Palabras clave:

Perfil Epistemológico, Ensino de Física, Mecânica Quântica, Teoria da Mediação Cognitiva (pt).

Biografía del autor/a

Robson Trevisan, Universidade Luterana do Brasil

Doutorando no Programa de Pós-Graduação em Ensino de Ciências e Matemática da Universidade Luterana do Brasil.

Agostinho Serrano de Andrade Neto, Universidade Luterana do Brasil

Doutor em Física – Docente do Programa de Pós-Graduação em Ensino de Ciências e Matemática da Universidade Luterana do Brasil.

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Cómo citar

APA

Trevisan, R., y de Andrade Neto, A. S. (2016). Um estudo da relação entre as imagens mentais utilizadas por estudantes de mecânica quântica e seu perfil epistemológico: uma investigação pela metodologia report aloud. Góndola, Enseñanza y Aprendizaje de las Ciencias, 11(2), 212–227. https://doi.org/10.14483/udistrital.jour.gdla.2016.v11n2.a4

ACM

[1]
Trevisan, R. y de Andrade Neto, A.S. 2016. Um estudo da relação entre as imagens mentais utilizadas por estudantes de mecânica quântica e seu perfil epistemológico: uma investigação pela metodologia report aloud. Góndola, Enseñanza y Aprendizaje de las Ciencias. 11, 2 (jul. 2016), 212–227. DOI:https://doi.org/10.14483/udistrital.jour.gdla.2016.v11n2.a4.

ACS

(1)
Trevisan, R.; de Andrade Neto, A. S. Um estudo da relação entre as imagens mentais utilizadas por estudantes de mecânica quântica e seu perfil epistemológico: uma investigação pela metodologia report aloud. Góndola Enseñ. Aprendiz. Cienc. 2016, 11, 212-227.

ABNT

TREVISAN, Robson; DE ANDRADE NETO, Agostinho Serrano. Um estudo da relação entre as imagens mentais utilizadas por estudantes de mecânica quântica e seu perfil epistemológico: uma investigação pela metodologia report aloud. Góndola, Enseñanza y Aprendizaje de las Ciencias, [S. l.], v. 11, n. 2, p. 212–227, 2016. DOI: 10.14483/udistrital.jour.gdla.2016.v11n2.a4. Disponível em: https://revistas.udistrital.edu.co/index.php/GDLA/article/view/9521. Acesso em: 5 nov. 2024.

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Trevisan, Robson, y Agostinho Serrano de Andrade Neto. 2016. «Um estudo da relação entre as imagens mentais utilizadas por estudantes de mecânica quântica e seu perfil epistemológico: uma investigação pela metodologia report aloud». Góndola, Enseñanza y Aprendizaje de las Ciencias 11 (2):212-27. https://doi.org/10.14483/udistrital.jour.gdla.2016.v11n2.a4.

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Trevisan, R. y de Andrade Neto, A. S. (2016) «Um estudo da relação entre as imagens mentais utilizadas por estudantes de mecânica quântica e seu perfil epistemológico: uma investigação pela metodologia report aloud», Góndola, Enseñanza y Aprendizaje de las Ciencias, 11(2), pp. 212–227. doi: 10.14483/udistrital.jour.gdla.2016.v11n2.a4.

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R. Trevisan y A. S. de Andrade Neto, «Um estudo da relação entre as imagens mentais utilizadas por estudantes de mecânica quântica e seu perfil epistemológico: uma investigação pela metodologia report aloud», Góndola Enseñ. Aprendiz. Cienc., vol. 11, n.º 2, pp. 212–227, jul. 2016.

MLA

Trevisan, Robson, y Agostinho Serrano de Andrade Neto. «Um estudo da relação entre as imagens mentais utilizadas por estudantes de mecânica quântica e seu perfil epistemológico: uma investigação pela metodologia report aloud». Góndola, Enseñanza y Aprendizaje de las Ciencias, vol. 11, n.º 2, julio de 2016, pp. 212-27, doi:10.14483/udistrital.jour.gdla.2016.v11n2.a4.

Turabian

Trevisan, Robson, y Agostinho Serrano de Andrade Neto. «Um estudo da relação entre as imagens mentais utilizadas por estudantes de mecânica quântica e seu perfil epistemológico: uma investigação pela metodologia report aloud». Góndola, Enseñanza y Aprendizaje de las Ciencias 11, no. 2 (julio 1, 2016): 212–227. Accedido noviembre 5, 2024. https://revistas.udistrital.edu.co/index.php/GDLA/article/view/9521.

Vancouver

1.
Trevisan R, de Andrade Neto AS. Um estudo da relação entre as imagens mentais utilizadas por estudantes de mecânica quântica e seu perfil epistemológico: uma investigação pela metodologia report aloud. Góndola Enseñ. Aprendiz. Cienc. [Internet]. 1 de julio de 2016 [citado 5 de noviembre de 2024];11(2):212-27. Disponible en: https://revistas.udistrital.edu.co/index.php/GDLA/article/view/9521

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UM ESTUDO DA RELAÇÃO ENTRE AS IMAGENS MENTAIS UTILIZADAS POR ESTUDANTES DE MECÂNICA QUÂNTICA E SEU PERFIL EPISTEMOLÓGICO: UMA INVESTIGAÇÃO PELA METODOLOGIA REPORT ALOUD

Study on the relationship between mental images and the epistemological profile of quantum mechanics students: an investigation using the report aloud methodology

Robson Trevisan 1, Agostinho Serrano de Andrade Neto 2

Cómo citar este artículo: Trevisan R., Andrade Neto, A. S. (2016). Um estudo da relação entre as imagens mentais utilizadas por estudantes de mecânica quântica e seu perfil epistemológico: uma investigação pela metodologia report aloud. Góndola, Enseñ Aprend Cienc, 11(2), 212-227. doi: 10.14483/udistrital.jour.gdla.2016.v11n2.a4.

Recibido: 29 de octubre 2015 / Aceptado: 10 de agosto de 2016


1 Doutorando no Programa de Pós-Graduação em Ensino de Ciências e Matemática da Universidade Luterana do Brasil. Correo electrónico: robsontrevi@gmail.com.

2 Doutor em Física – Docente do Programa de Pós-Graduação em Ensino de Ciências e Matemática da Universidade Luterana do Brasil. Correo electrónico: asandraden@gmail.com.


Resumo

Este artigo investiga a relação entre o perfil epistemológico do estudante, suas imagens mentais e drivers construídos após a utilização de experimentos virtuais. Para tanto, escolheu-se como conteúdo de conhecimento o comportamento dual da matéria e da radiação eletromagnética, tópico fundamental da Mecânica Quântica dentro do currículo de estudantes de licenciatura em física. O referencial teórico adotado para leitura dos dados foi a Teoria da Mediação Cognitiva (TMC), buscando explicar como a mediação por computador modifica a estrutura cognitiva dos estudantes. Também utilizou-se a ideia de Perfil Epistemológico Bachelardiano para relacioná-lo com o raciocínio apresentado pelos alunos. Observou-se mudanças de drivers psicofísicos e culturais já existentes na estrutura cognitiva dos estudantes. Apesar desse resultado positivo, verificou-se uma inconsistência conceitual dos alunos para a explicação do comportamento dual de objetos quânticos.

Palavras chave: Perfil Epistemológico. Ensino de Física. Mecânica Quântica. Teoria da Mediação Cognitiva.

Abstract

This paper investigates the relationship between the epistemological profile of the student, their mental images, and drivers built after the use of virtual experiments. For this, was chosen as the dual behavior knowledge content of matter and electromagnetic radiation, a fundamental topic of Quantum Mechanics in the curriculum of physics undergraduate students. The theoretical framework adopted for data reading was the Cognitive Mediation Networks Theory, seeking to explain how computer mediation modifies the cognitive structure of students. Also, we used the idea of Epistemological Profile Bachelardian to relate it to the reasoning presented by the students. We observed changes in psychophysical and cultural drivers already in the cognitive structure of students. Despite this positive result, there was a conceptual inconsistency of students for the dual behavior of the explanation of quantum objects.

Keywords: Epistemological Profile. Physics Teaching. Quantum Mechanics. Cognitive Mediation Networks Theory.


Introdução

A Mecânica Quântica (MQ) marca no início do século XX uma nova etapa para a história da Física, sendo ao lado da Relatividade a base da Física Contemporânea. A teoria quântica é tida como uma teoria sólida e de sucesso, pois suas previsões têm sido comprovadas experimentalmente ao longo deste século com grande precisão. Mesmo diante deste cenário, “[...] é notável, no entanto, que a mecânica quântica tenha dezenas de interpretações diferentes. Ou seja, mesmo havendo concordância sobre o formalismo da teoria, não há consenso sobre o que ela diz em relação à realidade” (Pessoa Jr, O. 2008, p.32).

Diante disso, pode-se destacar o tema da dualidade onda-partícula da matéria e da radiação eletromagnética. Este tema proporcionou o surgimento de inúmeras interpretações para a ocorrência dos fenômenos observados principalmente no aparato experimental da dupla fenda, que, de acordo com Feynman, R.; Leighton, R.; Sands, M. (1963), é um fenômeno absolutamente impossível de se explicar classicamente, e contém em si o coração da física quântica. Baseados nesses aspectos, trabalhos foram realizados com o objetivo de verificar as principais interpretações apresentadas por estudantes ao se depararem com o fenômeno da dualidade, buscando também, sempre que possível, verificar como estava ocorrendo didaticamente (metodologicamente) o ensino da MQ. Dentre esses trabalhos pode-se destacar o de Montenegro, R.; Pessoa Jr, O. (2002).

No ensino e na aprendizagem da MQ, analisar os fatos empíricos e desenvolver o formalismo matemático não é suficiente. Betz, M. (2014) reforça que ainda é preciso deter-se à questão da interpretação, envolvendo-se, então, com os seguintes questionamentos: o que as grandezas presentes nas equações representam? Como elas se relacionam com os dados que podem ser extraídos dos experimentos? Que visão do mundo físico pode-se construir a partir daí? Essas indagações têm sido debatidas frequentemente entre físicos e filósofos, desde o surgimento da teoria, e vêm despertando um interesse crescente nesta última década, tanto no meio acadêmico dos especialistas quanto no público leigo.

Observando o panorama apresentado, este trabalho buscou utilizar ferramentas hiperculturais (bancadas virtuais) como forma de mediação digital em atividades com alunos do curso de Licenciatura em Física, complementando as abordagens tradicionais de ensino na construção ou modificação de conhecimentos relacionados à dualidade. Tendo, assim, o objetivo de, após tal intervenção hipercultural, verificar as interpretações dos alunos e, a partir delas, traçar um perfil epistemológico privado, de acordo com a noção do conceito expressado individualmente pelos alunos.

Certamente, ensinar MQ não é uma tarefa fácil. Seus princípios fogem da visão clássica de mundo, mas todos esses elementos tornam inadiável a necessidade de se propiciar aos profissionais das carreiras que mais utilizam esses recursos o conhecimento de fundamentos da MQ, não apenas de "regras" ou de algoritmos de resolução (Greca, I. 2000).

Pelo fato deste trabalho estar utilizando softwares em forma de bancadas virtuais como mediadores no ensino de um tópico da MQ, optou-se pela adoção da Teoria da Mediação Cognitiva (TMC) como aporte teórico norteador, em razão da sua abordagem relacionada à mediação hipercultural, em especial mediante o uso de computadores. Também será apresentada a ideia de perfil epistemológico Bachelardiano, tendo em vista que, esta pesquisa busca levantar os perfis privados dos estudantes acerca da dualidade onda-partícula. Além disso, será discutida a visão assumida a respeito dos conceitos de imagens mentais.

A teoria da mediação cognitiva

A teoria da mediação cognitiva (TMC) é uma teoria contextualista, construtivista, que estuda o processamento da informação da inteligência humana e visa proporcionar uma abordagem ampla para a cognição. Devido à expansão atual da era digital, a TMC busca explicar os impactos das tecnologias digitais no pensamento humano. Souza, B. (2004) evidencia que o cérebro humano isolado se apresenta como insuficiente para explicar a maior parte do desempenho cognitivo, conclui a existência e o envolvimento de outros mecanismos de processamento de informações. Dessa forma, alguns elementos no ambiente têm potencial para o processamento de informação, os quais são observados e lhes é tirada vantagem pelos seres humanos.

[...] aspecto fundamental da Mediação Cognitiva é o conjunto individual de mecanismos internos, o qual torna possível a utilização de estruturas externas, como auxiliares de dispositivos de processamento de informações, mas também trabalham como “máquinas virtuais” internas, que fornecem novas funcionalidades cognitivas, acrescentando benefícios que duram para além do tempo da “conexão” a um mecanismo externo, tendo um papel importante na definição da forma como o pensamento ocorre. (Souza, B. 2004, 2006, Souza, B.; Roazzi, A. 2000 apud Souza, B. et al, 2012, p.3)

A mediação digital é um processamento extracerebral bastante presente atualmente, devido à explosão digital dos últimos anos. No contexto da tecnologia da informação, os computadores destacam- se dos demais objetos passíveis de uso para a mediação externa, em razão de sua extrema plasticidade lógica e programabilidade.

Logo, é possível se afirmar que, na atual Revolução Digital, testemunha-se a emergência de uma Hipercultura, onde os mecanismos externos de mediação passam a incluir os dispositivos computacionais e seus impactos culturais, enquanto que os mecanismos internos incluem as competências necessárias para o uso eficaz de tais mecanismos externos. (Souza, B. 2004, p. 85)

Sendo assim, a TMC apresenta a Mediação e o Processamento Extracerebral de Informações como mecanismos que auxiliam no processamento cognitivo. A partir dessa ideia principal, o autor constrói um conjunto de conceitos, dentro do seu proposto referencial teórico, dos quais, chamam atenção os “mecanismos externos de mediação” e os “mecanismos internos de mediação”, buscando trazer uma perspectiva diferenciada no que se refere a considerar a chamada cognição externa (ao cérebro). Pode-se, aqui, citar o fato do uso de dispositivos eletrônicos – computadores, tablets e smartphones – se dar por um processo de mediação. Então, é possível inferir que esses dispositivos se tornem mecanismos externos de mediação e que os mecanismos internos são construídos com o passar do tempo e com a necessidade de aquisição de novas competências para o uso desses dispositivos.

Os drivers

A TMC considera drivers dispositivos que trabalham como “máquinas virtuais” internas, que possuem um papel importante na definição do pensamento humano no contexto da mediação e vão além da “conexão” com o mecanismo externo:

É razoável supor que os mecanismos internos de mediação funcionem através da produção de um shell, ou seja, de uma "máquina virtual" que "espelha" ou "representa" o mecanismo externo. Trata-se de um processo necessário para o estabelecimento de uma interface entre o cérebro e o mecanismo extracerebral, mas também permite, até certo ponto, uma "emulação" ao menos parcial dos mecanismos externos em questão. Isso implica, portanto, numa internalização parcial dos mecanismos externos, o que ajuda a explicar por que as habilidades permanecem aumentadas mesmo quando os mecanismos externos estão ausentes. (Souza, B. 2004, pp. 81-82)

O surgimento da hipercultura é visto pela TMC como consequência de novas formas de interação, envolvendo grupos sociais e as tecnologias no nível do indivíduo. Portanto, simuladores virtuais atuam como mediadores digitais a fim de criar novas representações mentais (teoremas-em-ação) e drivers na cognição do indivíduo, com a finalidade de proporcionar uma aprendizagem significativa dos conceitos quânticos abordados. Dada a natureza das representações mentais, sua mera existência dota o indivíduo com um conjunto de ferramentas lógicas que aumenta sua competência em domínios específicos, mesmo na ausência do sistema externo físico correspondente (Souza, B. et al, 2012). A partir dessa mediação, adquire um ganho de processamento de informações que se mantém, mesmo que a conexão com o mecanismo externo seja interrompida. Esses drivers são originados dos mecanismos de mediação externa utilizados pelo indivíduo, que podem ser de natureza psicofísica (quando o indivíduo utiliza de objetos do ambiente como mecanismo de processamento extracerebral), social (devido à conexão social com outros indivíduos por meio da linguagem), cultural (devido à utilização de ferramentas culturais como livros, etc) ou hipercultural (utilização das TIC).

Este trabalho busca identificar os drivers dos estudantes acerca dos conceitos fundamentais da MQ, para tanto, faz-se uma conexão com as imagens mentais dos alunos, em razão de considerar essas imagens componentes explícitas das estruturas dos drivers. Tal comparação é conjecturada pelo fato de que esta investigação assume concepção acerca de imagens mentais apresentada por Otero (2004), na qual estima as imagens como representações analógicas com semelhança estrutural com o que elas representam, e não meras experiências subjetivas. Essas imagens podem ser geradas pela visualização de algum objeto ou situação, mesmo que brevemente, ou, na maior parte dos casos, as imagens são geradas com base em um conjunto de informações armazenadas na memória.

Essa visão também é adotada por Wolff (2015), em sua pesquisa de doutoramento, na qual acrescenta que a imagem mental não será uma cópia da percepção visual de objetos externos, mas resultado do processo interpretativo do estudante, onde o resultado depende também do seu conhecimento.

A ideia de Perfil Epistemológico Bachelardiano

O positivismo atribuído à pesquisa científica, bem como a objetividade no trabalho dos cientistas,são fatores que contrariam as ideias de Bachelard, G. (1985,1991) apresentadas em suas obras, como “O Novo Espírito Científico” (1985) e “A Filosofia do Não” (1991). Ressalta, então, a necessidade de construção de um pensamento complexo para a ciência e uma postura de reflexão filosófica sobre a prática científica.

Com o intuito de mostrar que diferentes filosofias podem estar presentes na mesma acepção de um conceito, ainda que algumas delas sejam, conscientemente, consideradas inadequadas para caracterizar determinada noção do conhecimento científico, Bachelard, G. (1991) apresenta ideias vinculadas ao termo por ele denominado como “perfil epistemológico”, que caracteriza justamente as diversas escolas filosóficas e posturas de natureza epistemológica dos sujeitos. Isto é, essa pluralidade representa diferentes formas de ver e representar a realidade, tanto para o mesmo sujeito em relação a um conceito científico, quanto para um mesmo conceito em diferentes contextos históricos.

Em sua obra “A Filosofia do Não” (1991), Bachelard apresenta suas ideias que culminam no termo cunhado como “perfil epistemológico”, utilizando um exemplo sobre a definição do conceito de massa e energia, onde o autor traça e analisa o seu perfil epistemológico pessoal, tanto para a noção de massa quanto para a noção de energia, comparando-os posteriormente.

As cinco filosofias que Bachelard aponta como responsáveis pelas suas noções de massa e energia são: realismo ingênuo, empirismo claro e positivista, racionalismo clássico da mecânica racional, racionalismo completo (relatividade) e o racionalismo discursivo. Neste tocante, o autor relaciona essas filosofias de maneira a evidenciar o grau de importância ao expressar a frequência de utilização efetiva da noção dos conceitos. Desta forma, o perfil epistemológico do próprio autor é traçado.

Diante desse perfil, inferências podem ser traçadas com o intuito de apontar as filosofias que se destacam no processo de definição do determinado conceito escolhido, sendo que esse perfil epistemológico, de acordo com Bachelard, G. (1991, p.25), “[...] deve sempre referir-se a um conceito designado, de ele apenas ser válido para um espírito particular que se examina num estádio particular da sua cultura”.

Através deste cenário, acentua-se a pluralidade filosófica na postura epistemológica do sujeito em sua prática científica.

[...] a qualquer atitude filosófica geral, pode opor- -se, como objeção, uma noção particular cujo perfil epistemológico revela um pluralismo filosófico. Uma só filosofia é, pois, insuficiente para dar conta de um conhecimento preciso. Se então se quiser fazer, a diferentes espíritos, exatamente a mesma pergunta a propósito de um mesmo conhecimento, ver-se-á aumentar singularmente o pluralismo filosófico da noção. (Bachelard, G. 1991, p. 29)

Fazendo uso das ideias de Bachelard a respeito do perfil epistemológico do sujeito, pretende-se, neste trabalho, investigar as correntes filosóficas dos estudantes em relação ao conceito do comportamento dual da matéria e da radiação eletromagnética, após os mesmos realizarem atividades utilizando ferramentas hiperculturais.

Ao apresentar os gráficos para seu perfil epistemológico acerca do conceito de massa e de energia, Bachelard não explica como obteve os valores para a frequência de utilização pessoal de cada noção. Apenas aponta a dificuldade de estabelecer estes valores, ao citar que:

[...] tentaremos então pôr grosseiramente em evidência a sua importância relativa colocando em abcissas as filosofias sucessivas e em ordenadas um valor que - se pudesse ser exato - mediria a freqüência de utilização efetiva da noção, a importância relativa de nossas convicções. Com uma certa reserva relativamente a esta medida muito grosseira, obtemos então o nosso perfil epistemológico. (Bachelard, G. 1991, p.25)

Nas seções seguintes, serão tratados os instrumentos e métodos utilizados por esta pesquisa para verificar as filosofias expressadas pelos estudantes ao responderem questionamentos relacionados aos fenômenos envolvendo a dualidade onda-partícula.

Antecedentes A relação entre as visões filosóficas e suas noções acerca da dualidade

Bachelard, G. (1991) relacionou as suas interpretações privadas acerca dos conceitos de massa e energia com as visões filosóficas pertinentes e responsáveis por conduzir determinadas compreensões. Através dessa ideia, pretende-se, aqui, traçar uma relação entre as noções construídas ao longo da história acerca da dualidade e as visões filosóficas que são responsáveis pela estruturação do perfil epistemológico do indivíduo. Esta correspondência é sugerida por Pinto, A.; Zanetic, J. (1999) em meio as suas investigações sobre a inserção da MQ no Ensino Médio, na qual utilizam a ideia de Perfil Epistemológico como referencial filosófico.

Desta forma, as filosofias que serão adotadas e vinculadas com as noções acerca da natureza da luz estão descritas a seguir.

Realismo Ingênuo

Também pode ser denominado como Animismo, sendo considerado por Bachelard, G. (1991) um pensamento mais primitivo do indivíduo, o qual antecede o estágio científico da noção sobre determinados conceitos e fenômenos. A percepção de que a luz seria propriedade dos olhos e a concepção aristotélica de que a luz era resultado da atividade de um determinado meio, cuja vibração provocaria o movimento de humores presentes nos olhos, integram-se na filosofia animista (Rocha, J. 2002). Demais interpretações oriundas de meios não empíricos ou teóricos de entender a natureza da luz incorporam-se nessa visão filosófica. Também se encaixam nessa filosofia as representações animistas para os objetos quânticos, onde são atribuídos formatos geométricos com características visuais e de natureza tácita.

Empirismo claro e positivista

Assume-se empirismo claro e positivista como a visão que trata as noções explicadas por meio de fatos empíricos, em cujas observações dos feixes de luz em determinadas situações são as principais investigações na construção do conceito sobre a natureza da luz. Por exemplo, a observação de feixes de luz ao atravessarem fendas de uma janela ou em qualquer outro objeto. Dessa forma, também atrelam-se a esse conceito interpretações acreditando na percepção sensorial defendida pelos atomistas, na qual os objetos emitiam átomos que atingiam os órgãos da visão para formar a imagem no cérebro. Sendo assim, “um pensamento empírico associado a uma experiência tão peremptória, tão simples, recebe então o nome de pensamento realista” (Bachelard, G. 1991, p.15), fundamentado empiricamente, o que o difere do realismo ingênuo.

Racionalismo Clássico

Para a visão racional, é tomado como referência a categorização apresentada por Pinto, A.; Zanetic, J. (1999), na qual adotam para esta filosofia modelos com fundamentação teórico-matemática, a exemplo do modelo corpuscular de Newton e o ondulatório de Huygens.

Ultra-racionalismo

Optou-se por utilizar o ultra-racionalismo, sendo essa a visão filosófica que agrupa o racionalismo completo e racionalismo discursivo adotados por Bachelard, G. (1991). Trata-se de um pensamento mais sofisticado, ou seja, é a evolução filosófica de um conhecimento científico particular, seguindo um caminho que se inicia no animismo e tem o ultra- -racionalismo como ponto de chegada. De acordo com Bachelard, G. (1991), esse aspecto filosófico do conhecimento físico constitui a essência do novo espírito científico, permitindo, através do seu estudo, “captar o pensamento científico contemporâneo e mostrar a novidade essencial que lhe é própria” (Bachelard, G. 1991, p. 97).

Para o ultra-racionalismo, é concebida toda a explicação que faz menção às interpretações modernas da FQ para a natureza da luz. Atribui-se, por exemplo, a visão ondulatória de Schrödinger a corpuscular de Landé, a dualista realista de De Broglie e Bohm e a dualista positivista de Bohr.

É importante ressaltar que, de acordo com Bachelard, G. (1991), um conhecimento específico pode expor-se numa filosofia particular, mas não pode fundar-se numa única filosofia, o seu progresso implica aspectos filosóficos variados.

Problema de pesquisa e métodos

O problema de pesquisa norteador deste trabalho circunda a seguinte questão: Qual a relação entre o perfil epistemológico do estudante, suas imagens mentais e drivers construídos após a utilização de experimentos virtuais de Mecânica Quântica?

Duas outras questões auxiliares são apresentadas para complementar o problema central de pesquisa:

• É possível se identificar as imagens mentais e drives após utilização de experimentos virtuais de mecânica quântica?

• É possível se identificar o perfil epistemológico destes estudantes?

De acordo com o problema de pesquisa proposto, o presente artigo tem como objetivo utilizar bancadas virtuais como mediação hipercultural no processo de construção de conhecimentos relacionados ao comportamento dual da matéria e da radiação eletromagnética, que, segundo Pessoa Jr, O. (2006), é um tópico que caracteriza a Teoria Quântica, atribuindo aspectos ondulatórios a qualquer partícula individual e aspectos corpusculares a qualquer forma de radiação. Portanto, tendo a finalidade de verificar quais representações e drivers de estudantes de física são adquiridos ou modificados após a utilização de ferramentas hiperculturais para, fazendo o uso dessa verificação, analisar o perfil epistemológico dos discentes diante da noção de conceitos relacionados ao comportamento dual da matéria e da radiação eletromagnética.

Para tanto, opta-se por utilizar como referencial epistemológico a TMC, em razão de sua abordagem relacionada à mediação hipercultural, em especial mediante o uso de computadores, sendo essas ferramentas tecnológicas responsáveis pela realização de processamentos externos de informação, interagindo com os mecanismos internos de processamento e, como consequência, modificando a estrutura cognitiva do indivíduo. Também será utilizada a ideia de perfil epistemológico proposta por Bachelard, com o intuito de averiguar as filosofias intrínsecas dos estudantes, responsáveis pela sua interpretação do fenômeno da dualidade.

As atividades da pesquisa foram desenvolvidas com uma amostra de 7 estudantes que cursavam a fase final do curso de Licenciatura em Física, sendo 4 discentes de uma instituição de ensino pública da cidade de Bento Gonçalves-RS e 3 discentes de uma instituição privada da cidade de Canoas-RS. O desenvolvimento dessa atividade será apresentado em quatro etapas, sendo elas:

Etapa I

Na primeira etapa, um pré-teste3 foi construído e validado pelos autores e posteriormente aplicado aos estudantes, antes que os mesmos tivessem qualquer contato com os softwares que serão utilizados como proposta deste trabalho. Os pré-testes foram resolvidos individualmente pelos estudantes.

Etapa II

Nesta fase, foi entregue aos alunos um roteiro de atividades4 para conduzir a utilização dos dois softwares propostos. Os simuladores foram empregados segundo a abordagem P.O.E., Predizer-Observar- Explicar, na qual os estudantes são chamados a predizer o comportamento de uma situação-problema ou de um experimento, observar a simulação e, após essas etapas, explicar possíveis diferenças entre suas concepções e o observado (Wu, H. et al., 2001). É durante esse estágio, com duração de 6 horas/aula, que acreditamos ocorrer a internalização dos drives intrínsecos às representações computacionais. O software A - Interferômetro Virtual de Mach-Zehnder (Figura 1-I) permite ao usuário observar o fenômeno de interferência produzido por um feixe de luze por fótons individuais. O software B - Fenda Dupla de Young (Figura 1-II) permite observar o comportamento de objetos clássicos e quânticos ao passarem por fendas estreitas e muito próximas.

Na semana seguinte ao término das atividades utilizando os softwares, foi aplicado aos alunos o pós-teste5 , contendo questões abertas e fechadas referentes ao mesmo conteúdo abordado no pré-teste, o comportamento dual da matéria e da radiação eletromagnética.

Etapa IV

Esta etapa consiste em entrevistas realizadas individualmente com os alunos, tendo como pauta as questões e as respostas do pós-teste. As entrevistas foram conduzidas conforme o protocolo “Report Aloud”, sendo uma adaptação da técnica “Think Aloud” (Van-Someren, M. et al, 1994). A diferença entre os métodos é que no “Think Aloud” o entrevistador e o entrevistado mantêm constante diálogo a respeito do que o entrevistado está pensando durante a execução de uma tarefa, ou seja, enquanto o estudante responde o questionário ele pensa em voz alta, já no “Report Aloud” o estudante reporta ao entrevistador o seu processo de pensamento enquanto estava respondendo as questões, isto é, o estudante resolve as questões e só depois, ao finalizá- las, reporta o seu processo de pensamento. As entrevistas foram gravadas e transcritas, tal como os áudios produzidos pelos alunos (sic) para a devida análise.

Os resultados foram obtidos após as análises realizadas sobre os pré-testes, pós-testes e imagens de vídeo obtidas durante as entrevistas do pós-teste. A apreciação do conteúdo dessas gravações foi realizada por análise gestual descritiva (Monaghan, J.; Clement, J. 1999). Essa metodologia já foi utilizada em outros trabalhos (Andrade Neto, A.; Engel, V. 2012; Rocha, J.; Andrade Neto, A. 2013; Trevisan, R.; Andrade Neto, A. 2014; Ramos, A. 2015).

A base metodológica de Monaghan, J.; Clement, J. (1999) consiste em utilizar alguns indicadores, tais como os movimentos de mãos para sugerir que os estudantes estavam se utilizando de imagens dinâmicas de simulações mentais durante a tarefa de resolução de problemas de movimento relativo. Diante disso, acredita-se na possibilidade de se obter o conhecimento implícito do aluno inerente às suas visualizações internas (simulação mental do raciocínio), após a mediação hipercultural (em forma de bancadas virtuais), por meio da sua externalização gestual.

A interpretação dos gestos poderá fornecer informações que não são identificadas apenas através da fala. Isto é, a informação transmitida gestualmente está relacionada com a transmitida verbalmente, sem que ambas devam ser necessariamente a mesma informação transmitida. Portanto, os gestos podem auxiliar na transmissão de informação sempre que houver dificuldade de expressão verbal. Assim, é possível identificar padrões de gestos e relacioná-los com os conhecimentos implícitos – considerados nesta pesquisa como drivers – existentes na estrutura cognitiva dos estudantes (Trevisan, R. 2016). Dessa forma, pode-se extrair do estudante seus drivers internalizados. Esses drivers dependem diretamente dos tipos de mediações utilizadas para resolver uma situação-problema.

A análise textual discursiva proposta por Moraes, R.; e Galiazzi, M. (2011) também é empregada neste trabalho com o objetivo de abarcar a análise da linguagem verbal, presente nos instrumentos para as coletas dos dados produzidos pelos sujeitos envolvidos na pesquisa, o chamado corpus. Essa metodologia consiste na análise e interpretação dos diferentes materiais obtidos durante a pesquisa, com o objetivo de compreender de maneira mais profunda as informações contidas no objeto em estudo.

Resultados e Análise

Conectando, portanto, a TMC empregada ao ensino de física juntamente com a ideia de perfil epistemológico Bachelardiano, serão apresentados os resultados de dois estudantes, um discente (que será tratado como A1) oriundo de uma instituição de ensino superior privada e outro (que será tratado como A2) de uma instituição de ensino superior pública, ambos em fase final do curso de Licenciatura em Física. Inicialmente, serão apresentados os resultados expressados pelo A1.

Os primeiros questionamentos foram voltados aos fenômenos vinculados e observados através do interferômetro de Mach-Zehnder (software A). Ao explicar o caminho percorrido pelo fóton no interferômetro, desde a fonte de emissão até o anteparo de observação, o A1 começa a expressar a sua interpretação quanto ao comportamento do fóton. Inicia seu raciocínio afirmando que imagina o fóton sendo dividido ao encontrar o primeiro espelho semi- refletor: “esse anteparo (espelho semi-refletor) é pros dois lados, vai refletir metade dos fótons prum lado e metade pro outro” (A1).

Dando sequência à sua explicação, o aluno fala em imaginar o segundo espelho semi-refletor unindo os fótons anteriormente separados: “metade vem por um lado, metade vem por outro, e lá em cima eles vão se unir. No caso, eles vão se juntar os dois e vão chegar no anteparo” (A1). Após essa explicação, o aluno é questionado se a sua explicação era para um fóton, neste caso, se era um fóton dividindo em dois ou ele estava imaginando vários fótons. Ele responde: “vários fótons, um vai para um lado o outro vai para o outro” (A1).

Para explicar o padrão de interferência formado no anteparo, o aluno imagina o segundo espelho semi-refletor canalizando os fótons. Nas próprias palavras do aluno, “chegam no anteparo em vales e picos”, citando, portanto, características ondulatórias, como a interferência construtiva e destrutiva, responsáveis, na sua opinião, pelos pontos claros e escuros (comportamento ondulatório) observados no anteparo cintilante.

Seguindo a conversa, o aluno ao ser questionado quanto à sua imaginação sobre o fóton isolado, sem o mesmo estar presente em aparatos experimentais, responde imaginar “o formato de uma partícula né, uma bolinha redonda” (A1). Na Figura 2 abaixo, recortamos do vídeo da entrevista uma figura que do gesto descritivo que corresponde a uma imagem mental específica: nas palavras do próprio estudante, uma bolinha redonda. De acordo com o restante da entrevista, esta “bolinha redonda” é parte de um driver, possivelmente originado de observação de corpúsculos se movendo à semelhança de um bilhar, deslocando-se em linhas retas e, ao colidir com uma superfície, ricocheteia em ângulo de retorno igual ao incidente. Dessa forma, a partir da imagem mental identificada pela analise do discurso verbal e gestual, podemos tornar explicito o driver utilizado. Este driver, necessariamente, reforça uma interpretação corpuscular (seja ela pura ou mista) do objeto quântico.

Nota-se que o aluno iniciou seu raciocínio com o intuito de explicar a trajetória com a fonte em regime monofotônico, mas o mesmo explica a trajetória de vários fótons passando pelo interferômetro. Visto que o discente necessita imaginar vários fótons para explicar o comportamento ondulatório, pois, se ele imaginar apenas um único fóton, a representação que surge é a de um corpúsculo clássico, e em sua ideia apresentaria um comportamento corpuscular no anteparo.

Analisando o raciocínio do A1 diante das respostas aos questionamentos relacionados ao experimento da fenda dupla de Young (software B), a mesma interpretação e explicação para o comportamento do fóton é dada para o elétron. Em ambas as situações, com a fonte emitindo fótons e elétrons, o aluno os interpreta como onda. Julga-se que essa opinião se deve ao fato de o aluno já ter visto no estudo da óptica a análise com enfoque ondulatório para o experimento da fenda dupla, ou seja, teoricamente, era de seu conhecimento o surgimento do padrão de interferência. Entretanto, o estudante não apresenta conhecimentos relacionados à possibilidade de destruição do padrão de interferência e o surgimento de um borrão, caracterizando o comportamento corpuscular do fóton e do elétron, quando se é sabida a fenda pela qual o objeto quântico atravessou.

Analisando o raciocínio e a interpretação averiguada após a utilização dos softwares, traçaremos o perfil epistemológico do estudante em relação à noção da dualidade onda-partícula do fóton e do elétron. Para tanto, serão adotadas as ideias do trabalho de Montenegro, R.; Pessoa Jr, O. (2002) de categorização, com relação à ontologia, nas quais uma interpretação pode considerar um objeto quântico (fóton, elétron) de maneira corpuscular, ondulatória ou dualista. Quanto às atitudes epistemológicas, as duas fundamentais são o realismo e o positivismo. Com essas categorias, os autores apresentam quatro grandes grupos interpretativos: Interpretação Ondulatória (realista), Interpretação Corpuscular (realista), Interpretação Dualista Realista e a Interpretação Dualista Positivista.

Portanto, a interpretação que mais se adéqua ao raciocínio utilizado pelo A1 é a Interpretação (ainda não consolidada) Dualista Realista. O estudante, em diversos momentos, remete o fóton e o elétron como partícula e como onda, associando uma onda aos objetos quânticos, ondas responsáveis pela interferência construtiva ou destrutiva. Desta forma, as imagens mentais referentes aos fenômenos ondulatórios clássicos também constituem os drivers utilizados pelo estudante para resolver as situações problemas propostas pelos instrumentos da pesquisa. Possivelmente os drivers culturais prevalecem na estrutura cognitiva do aluno, pois o mesmo não faz menção direta, em suas respostas, aos softwares utilizados.

Esboçando o perfil epistemológico do aluno 1

Após a apresentação dos argumentos utilizados pelo aluno para explicar o seu entendimento dos fenômenos estudados através dos softwares, será exibido a seguir o esboço do perfil epistemológico acerca da noção da dualidade do A1.

A filosofia que se mostra mais representativa na formação da noção do A1, a respeito da dualidade, é o racionalismo clássico. As outras três filosofias que complementam o perfil (o realismo ingênuo, o empirismo claro e positivista e o ultra-racionalismo) aparecem com intensidades semelhantes e com diferença significativa para o racionalismo clássico. As justificativas para essa escolha são apontadas na sequência.

O racionalismo clássico se sobressai em virtude das diversas explicações clássicas utilizadas pelo aluno. Ainda que o mesmo apresente consciência da dualidade da luz, algumas indecisões estão presentes e contribuem para o raciocínio clássico apresentado pelo estudante em alguns pontos, como: a dificuldade apresentada em explicar a sua interpretação dual para o fóton com a fonte em regime monofotônico, em ambas as bancadas virtuais; e a escolha pela alternativa incorreta na questão a respeito da dupla fenda em regime quântico no pós-teste, que denunciam a postura clássica presente. A explicação utilizando a teoria ondulatória clássica é utilizada com maior frequência nas explicações para os fenômenos.

O ultra-racionalismo apresenta-se com uma diferença maior de intensidade para racionalismo clássico, o aluno apresenta uma interpretação dual para a luz e objetos quânticos. Os fundamentos utilizados, como a associação de uma onda ao elétron e fóton, são conjecturas modernas e que representam o ultra-racionalismo. A representatividade do ultra- -racionalismo no perfil de não se acentua, isso pelo fato de o aluno não ter, até o momento, desenvolvido uma acepção mais consolidada na manipulação das leituras dos fenômenos quando a fonte –tanto no IMZ quanto no AEDF– opera em regime quântico.

O realismo ingênuo e a atitude empirista e positivista apresentam-se também com intensidades semelhantes, o aluno adota uma postura realista e não utiliza com frequência os experimentos observados nas bancadas virtuais como importante na decisão de suas interpretações. A imagem mental responsável pela representação do fóton e elétron mostra-se ainda de maneira animista, contribuindo para a parcela do realismo ingênuo na construção espectral filosófica do A1 acerca da noção da dualidade.

Em seguida, serão apresentados os resultados e a análise do aluno 2 (A2).

Análise dos dados e resultados do A2

Iniciando a análise do raciocínio demonstrado pelo A2, verifica-se, primeiramente, o fenômeno no interferômetro virtual. O aluno considera o fóton com comportamento ondulatório, explicando o padrão de interferência por ele desenhado no pós-teste, devido à falta de conhecimento do caminho tomado pelo fóton após encontrar-se com o primeiro espelho semi-refletor do interferômetro, visto que as probabilidades de reflexão (percorrer uma das trajetórias possíveis) e de transmissão (percorrer a outra trajetória possível) do fóton são as mesmas: “como a gente desconhecia o caminho do fóton, então, mesmo sendo emitido um por vez, havia interferência, daí formava a figura de interferência” (A2).

E, ao ser questionado quanto ao comportamento do fóton durante o seu percurso no interferômetro, o aluno descreve o seu raciocínio com as seguintes palavras: “eu imaginaria ele todo percurso como uma partícula, né, embora eu saiba que ele é, né, da dualidade onda partícula, mas para eu imaginar o experimento, eu visualizaria como o fóton fazendo o caminho como sendo uma partícula”.

Portanto, o aluno utiliza uma representação corpuscular para o fóton, mas acaba desenhando um padrão com particularidade ondulatória no anteparo, pois, teoricamente, tem o conhecimento do comportamento dual do fóton, possuindo, desta forma, a previsibilidade do padrão formado no anteparo. O aluno também remete a uma partícula sua imaginação para um fóton isolado: “uma partícula bem pequenininha... como se fosse um pontinho” (figura 5).

Analisando o raciocínio do A2 diante das respostas aos questionamentos relacionados ao experimento da fenda dupla de Young, verifica-se uma explicação semelhante à apresentada para o interferômetro, ou seja, a interpretação do comportamento para os fótons e elétrons emitidos pela fonte, é a mesma.

Aluno 2: Então, imagina-se que ele passa por uma única fenda, mas a gente não sabe qual o caminho, que daí fica aquela questão da incerteza, e quando ele passa, ele tem um comportamento de onda, se não tiver nenhum observador, né. Se tiver um observador, daí perde o, a propriedade de onda, de interferência.

Assim, o aluno tem imagens mentais do fóton e do elétron como corpúsculos (tal como ilustrado nas Figuras 4 e 5), levando-o a utilizar drivers correspondentes, tal como já descrito anteriormente, os interpretando com o comportamento corpuscular em todo o percurso do aparato experimental, mas no anteparo o aluno desenha um padrão de interferência, sendo este um fenômeno ondulatório, atribuindo à sua resposta a falta de informação da fenda pela qual o elétron (a mesma explicação é utilizada para o fóton no experimento da fenda dupla) passa. Caso um observador detectasse por qual das fendas o elétron passou, o padrão observado no anteparo cintilante mudaria, isto é, a imagem de interferência no anteparo seria destruída.

Devido ao fato de o aluno já ter cursado uma disciplina que abordasse o comportamento dual do fóton e do elétron, os desenhos realizados nos anteparos no pós-teste estavam corretos. No entanto, o estudante não imagina o elétron em nenhum momento com comportamento ondulatório, o seu driver de representação para as partículas quânticas continua inalterado. Por exemplo, o aluno alega a imagem do elétron como partícula, pois em toda a sua trajetória acadêmica, ao estudar a eletricidade, sempre observou a representação de um elétron como uma esfera com um sinal negativo.

De acordo com Montenegro, R.; Pessoa Jr, O. (2002), podemos caracterizar uma interpretação (ainda não consolidada) Dualista Positivista manifestada pelo A2, sendo que a Interpretação Corpuscular (realista), em menor frequência, também é manifestada pelo aluno, caracterizada pela interpretação implícita ao se usar a Lógica Quântica, que pôde ser constatada em trechos do raciocínio do aluno. Estas duas interpretações que emergem de maneira incisiva no discurso do aluno, caracterizam o perfil epistemológico-ontológico do aluno para a noção da dualidade.

Esboçando o perfil epistemológico do aluno 2

Neste tocante, serão utilizados os drivers, imagens mentais e representações utilizadas pelo aluno durante a sua interpretação para os fenômenos estudados através das ferramentas hiperculturais em forma de bancadas virtuais para traçar o perfil epistemológico do A2 acerca da noção da dualidade.

O racionalismo clássico é a filosofia com maior destaque na compreensão do A2 acerca da dualidade, a atitude racional clássica manifesta-se em diversos pontos ao longo das explicações apresentadas pelo aluno. O arranjo experimental da dupla fenda em regime clássico é o experimento no qual A2 apresentou maior convicção em suas respostas, acessando seus drivers psicofísicos e culturais. O aluno fornece representações clássicas ao longo da exposição de seu raciocínio, imagina o fóton e, principalmente, o elétron como corpúsculos ao longo do IMZ e do AEDF, mas atribui uma propriedade de onda a esses objetos quânticos para justificar os comportamentos ondulatórios observados em algumas configurações dos softwares.

De acordo com o gráfico apresentado, o ultra- -racionalismo é a segunda filosofia presente com maior intensidade no espírito do indivíduo acerca da sua compreensão da dualidade. A sua consciência, ainda que incipiente, a respeito do comportamento dual da luz e dos objetos quânticos, conecta-se à postura ultra-racionalista, formada com o conhecimento de diversos conceitos ao longo de sua jornada acadêmica.

O aluno menciona ao longo de sua entrevista conhecimentos sobre o princípio da incerteza e a influência do observador (medida) nos experimentos em regime quântico, o que, em uma possível comparação com a representatividade desta filosofia nos perfiL apresentado anteriormente (de A1), contribui para a atribuição aparente a A2 do maior avanço conceitual na compreensão dos fenômenos estudados através das ferramentas hiperculturais.

O empirismo claro e positivista é a terceira filosofia com maior representatividade. Essa atitude é observada na necessidade do aluno em utilizar os experimentos para definir as suas interpretações a respeito da dualidade, sendo o empirismo, segundo o próprio aluno, fundamental para a sua metodologia de abordagem da dualidade, enquanto futuro professor da Física Moderna e Contemporânea. O realismo ingênuo é a atitude filosófica de menor intensidade, testemunhado nas representações dos objetos quânticos e na maneira como os mesmos são vinculados aos aparatos experimentais virtuais, isto é, uma definição animista acerca da imagem do fóton e elétron.

Assim sendo, esta análise filosófica espectral converge para as interpretações Dualista Positivista e Corpuscular (em menor veemência), verificadas ao longo dos dados levantados e investigados.

Considerações Finais

Os softwares utilizados neste trabalho, caracterizados como laboratórios virtuais (ou bancadas virtuais), apresentaram-se como processadores externos de informação, proporcionando aos alunos, através do guia de atividade baseado no P.O.E, a visualização e a análise do fenômeno dual da matéria e da radiação eletromagnética. No entanto, os softwares, não se mostraram eficazes para uma nova aquisição de drivers microscópicos resultantes de uma ferramenta hipercultural. Os drivers psicofísicos e culturais prevalecem no momento da resolução e explicação dos problemas. Para compreender o porquê, levantamos a hipótese de que os softwares utilizados não apresentam representações gráficas dos objetos quânticos utilizados: fóton ou elétron. Esta é uma das características (Doerr, H. 1997) dos “experimentos virtuais”, em contraponto às “simulações conceituais”. Enquanto o segundo se permite apresentar representações conceituais utilizadas pelos cientistas – bem como o que ocorre macroscopicamente em um experimento6 – o primeiro se limita a apresentar unicamente o que é observado em um experimento. Assim, as bancadas virtuais escolhidas apresentam apenas um padrão no anteparo, resultado da manipulação do aluno sobre o arranjo experimental virtual. Desta forma, as representações e drivers microscópicos já existentes acabam permanecendo não modificados, ou seja, o aluno faz uso de seus drivers psicofísicos e culturais para explicar o padrão formado no anteparo.

A metodologia utilizada no trabalho, com a escolha da técnica Report Aloud, possibilitou a detecção das mudanças dos drivers sociais e psicofísicos já existentes na estrutura cognitiva do indivíduo. Desta forma, foi possível verificar o raciocínio e as concepções dos estudantes diante dos fenômenos da dualidade que os softwares apresentam.

O perfil epistemológico dos alunos pode ser traçado de acordo com as interpretações privadas, inferidas a partir dos drivers conceituais, manifestados durante as entrevistas, onde foram comparados com as quatro principais interpretações da Teoria Quântica. Averiguou-se mudanças das interpretações ao longo das suas explicações, o que confirma a falta de certeza sobre uma explicação que possa ser tomada em seu raciocínio como correta para determinadas situações-problema.

O uso do perfil epistemológico de Bachelard e do discurso dos estudantes são suficientes para levantar boa parte do perfil epistemológico, contudo, quando utiliza-se as imagens mentais para dar maior fundamentação metodológica ao que o estudante está “visualizando internamente”, necesariamente fazemos o uso da TMC para entrelaçar as imagens mentais e os drivers. Ademais, o perfil epistemológico bachelardiano reinterpretado dentro da TMC implica, que, o perfil do estudante sofre influências dos mecanismos externos de cognição utilizados ao longo da vida, sendo esta a hipótese teórica central do trabalho, na qual diferentes mecanismos externos utilizados para compreender o fenômeno quântico da dualidade, alteram substancialmente o perfil epistemológico do indivíduo acerca do conceito.

Diante deste cenário, pode-se entender essa alternância nas explicações, seguidas de erros conceituais para os fenômenos observados nos softwares, como uma falha no ensino da MQ, visto que a dualidade onda-partícula é um tema central e “básico”, e que talvez o experimento paradigmático mais importante a ser passado para os alunos de MQ, seja o da dupla fenda para elétrons individuais (software B). Corroborando com as ideias de Montenegro, R e Pessoa Jr, O. (2002), afirmando que os cursos de Mecânica Quântica são excessivamente voltados para cálculos, dando pouca ênfase ao esclarecimento conceitual do assunto, não sendo vista como problemática a formulação matemática, mas, sim, o negligenciamento dos conceitos e questões interpretativas.

Agradecimentos

À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES).


NOTAS AL PIE

3 Disponibilizado em: http://migre.me/mOBbm

4 Disponibilizado em: http://migre.me/mODjQ

5 Disponibilizado em: http://migre.me/mODwd

6 Como visto, por exemplo, em Wolff (2015).


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