Os conceitos de ambiente, meio ambiente e natureza no contexto da temática ambiental: definindo significados

The concepts of environment, environment and natures in the context of environmental issue: defining meanings

Autores

  • Job Antonio Garcia Ribeiro Universidade Estadual Paulista.
  • Osmar Cavassan Universidade Estadual Paulista

Palavras-chave:

operational environment, representation of nature, perceived world, environmental education. (en).

Palavras-chave:

ambiente operacional, representação da natureza, mundo percebido, educação ambiental (es).

Biografia do Autor

Job Antonio Garcia Ribeiro, Universidade Estadual Paulista.

Programa de Pós Graduação em Educação para a Ciencîa. Bauru.

Osmar Cavassan, Universidade Estadual Paulista

PhD. Programa de Pos graduación en Educación para la Ciencia, UNESP. Bauru, Brasil.

Referências

ABBAGNANO, N. Dicionário de filosofia. São Paulo: Martins Fontes, 2003.

ART, H. Dicionário de ecologia e ciências ambientais. São Paulo: UNESP/Melhoramentos, 1998.

BEGON, M.; TOWNSEND, C.; HARPER, J. Ecologia: de Indivíduos a Ecossistemas. 4ª ed. Porto Alegre: Artmed, 2007.

BRANCO, S.; ROCHA, A. Ecologia: Educação Ambiental – ciências do ambiente para universitários. São Paulo: CETESB, 1980.

BRANCO, S. Ecossitêmica: uma abordagem integrada dos problemas do meio ambiente. 2ª edição. São Paulo: Editora Edgar Blücher LTDA, 1999.

CANGUILHEM, G. Living and its Milieu. Grey Room. v.3, p. 6-31, 2001.

CARVALHO, I. Educação ambiental: a formação do sujeito ecológico. São Paulo: Cortez, 2008.

COIMBRA, J. O outro lado do meio ambiente: a incursão humanista da questão ambiental. Campinas: Millennium, 2002.

COLLINGWOOD, R. A ideia da natureza. Editorial Presença. Lisboa, 1978.

DULLEY, R. Noção de natureza, ambiente, meio ambiente, recursos ambientais e recursos naturais. Revista Agricultura em São Paulo. v.51, n.2, p.15-26, 2004.

FERNANDEZ, F. In PETRY, A. C.; PELICICE, F. M.; BELLINI, L. M. (Orgs.) Ecólogos e suas histórias: um olhar sobre a construção das ideias ecológicas. Maringá: Eduem, 2010.

GONÇALVES, C. Os (des)caminhos do meio ambiente. 12ªEd. São Paulo: Contexto, 2005.

HEREDIA, J. Etologia animal, ontologia y biopolítica en Jakob von Uexküll. Filosofia e História da Biologia. v.6, n.1, p.69-86, 2011.

KLOPFER, P. Habitats and territories: a study of the use of space by animals. New York: London, 1969.

LALANDE, A. Vocabulário técnico e crítico da filosofia. São Paulo: Martins Fontes, 1999.

LENOBLE, R. História da ideia de Natureza. 1ªed. Lisboa: Portugal; Edições 70. 2002.

LEWONTIN, R. A tripla hélice: gene, organismo e ambiente. São Paulo: Companhia da Letras, 2002.

LEVINS, R.; LEWONTIN, R. The dialectical biologist. Harvard University Press, 1985.

MASON, H.; LANGENHEIM, J. Language Analysis and the Concept “Environment”. Ecology. v.38, n.2, p.325-340, 1957.

MERLEAU-PONTY, M. A Natureza. São Paulo: Martins Fontes, 2000.

REHBEIN, M. Ensaios sobre o meio (ambiente): os significados de natureza por olhares geográficos. Revista Geografar. v.5, n.1, p.155-175, 2010.

REIGOTA, M. Meio ambiente e representação social. 3ªed. São Paulo: Cortez, 1998.

______. O que é Educação Ambiental. 2ªed. São Paulo: Brasiliense (Coleção primeiros passos; 292), 2009.

RIBEIRO, J.; CAVASSAN, O. Um olhar epistemológico sobre o vocábulo ambiente: algumas contribuições para pensarmos a Ecologia e a Educação Ambiental. Filosofia e História da Biologia, v.7, n.2, p.241-261, 2012.

SPOMER, G. The concepts of “interaction” and “operational environment” in environmental analyses. Ecology, v.54, n.1, p200-204, 1973.

THOMAS, K. O homem e o mundo natural: mudanças de atitude em relação às plantas e aos animais (1500-1800). São Paulo: Companhia das Letras, 2010.

THOMAZ, S. In MEDEIROS, M.; BELLINI, L. Educação Ambiental como Educação Científica: desafios para compreender ambientes sob impactos. Londrina: Editora UEL, 2001.

TUAN, Y. “Environment” and “World”. The Professional Geographer. v.17, n.5, p.6-8, 1965.

UEXKÜLL, J. Ideas para una concepción biológica del mundo. Buenos Aires: Espasa-Calpe, 1951.

UEXKÜLL, T. A teoria da Umwelt de Jakob von Uexküll. Galáxia, p.19-48, 2004.

VARGAS, G. Naturaleza y medio ambiente: una visisón geográfica. Revista Geográfica Venezolana. v.46, n.2, p.289-304, 2005.

VILÀ VALENTÍ, J. Las distintas visions geográficas de las relaciones entre Naturaleza y Hombre. Revista de Geografía. v.18, p.5-17, 1984.

WHITEHEAD, A. O conceito de Natureza. São Paulo: Martins Fontes, 1993.

Como Citar

APA

Ribeiro, J. A. G., e Cavassan, O. (2013). Os conceitos de ambiente, meio ambiente e natureza no contexto da temática ambiental: definindo significados. Góndola, enseñanza y aprendizaje de las ciencias, 8(2), 61–76. https://doi.org/10.14483/23464712.5149

ACM

[1]
Ribeiro, J.A.G. e Cavassan, O. 2013. Os conceitos de ambiente, meio ambiente e natureza no contexto da temática ambiental: definindo significados. Góndola, enseñanza y aprendizaje de las ciencias. 8, 2 (jul. 2013), 61–76. DOI:https://doi.org/10.14483/23464712.5149.

ACS

(1)
Ribeiro, J. A. G.; Cavassan, O. Os conceitos de ambiente, meio ambiente e natureza no contexto da temática ambiental: definindo significados. Góndola Enseñ. Aprendiz. Cienc. 2013, 8, 61-76.

ABNT

RIBEIRO, Job Antonio Garcia; CAVASSAN, Osmar. Os conceitos de ambiente, meio ambiente e natureza no contexto da temática ambiental: definindo significados. Góndola, enseñanza y aprendizaje de las ciencias, [S. l.], v. 8, n. 2, p. 61–76, 2013. DOI: 10.14483/23464712.5149. Disponível em: https://revistas.udistrital.edu.co/index.php/GDLA/article/view/5149. Acesso em: 9 nov. 2024.

Chicago

Ribeiro, Job Antonio Garcia, e Osmar Cavassan. 2013. “Os conceitos de ambiente, meio ambiente e natureza no contexto da temática ambiental: definindo significados”. Góndola, enseñanza y aprendizaje de las ciencias 8 (2):61-76. https://doi.org/10.14483/23464712.5149.

Harvard

Ribeiro, J. A. G. e Cavassan, O. (2013) “Os conceitos de ambiente, meio ambiente e natureza no contexto da temática ambiental: definindo significados”, Góndola, enseñanza y aprendizaje de las ciencias, 8(2), p. 61–76. doi: 10.14483/23464712.5149.

IEEE

[1]
J. A. G. Ribeiro e O. Cavassan, “Os conceitos de ambiente, meio ambiente e natureza no contexto da temática ambiental: definindo significados”, Góndola Enseñ. Aprendiz. Cienc., vol. 8, nº 2, p. 61–76, jul. 2013.

MLA

Ribeiro, Job Antonio Garcia, e Osmar Cavassan. “Os conceitos de ambiente, meio ambiente e natureza no contexto da temática ambiental: definindo significados”. Góndola, enseñanza y aprendizaje de las ciencias, vol. 8, nº 2, julho de 2013, p. 61-76, doi:10.14483/23464712.5149.

Turabian

Ribeiro, Job Antonio Garcia, e Osmar Cavassan. “Os conceitos de ambiente, meio ambiente e natureza no contexto da temática ambiental: definindo significados”. Góndola, enseñanza y aprendizaje de las ciencias 8, no. 2 (julho 1, 2013): 61–76. Acessado novembro 9, 2024. https://revistas.udistrital.edu.co/index.php/GDLA/article/view/5149.

Vancouver

1.
Ribeiro JAG, Cavassan O. Os conceitos de ambiente, meio ambiente e natureza no contexto da temática ambiental: definindo significados. Góndola Enseñ. Aprendiz. Cienc. [Internet]. 1º de julho de 2013 [citado 9º de novembro de 2024];8(2):61-76. Disponível em: https://revistas.udistrital.edu.co/index.php/GDLA/article/view/5149

Baixar Citação

Visitas

7638

Dimensions


PlumX


Downloads

Não há dados estatísticos.

GÓNDOLA

Enseñanza y aprendizaje de las Ciencias

ISSN 2346-4712

Vol 8 No 2 Julio-Diciembre de 2013.


OS CONCEITOS DE AMBIENTE, MEIO AMBIENTE E NATUREZA NO CONTEXTO DA TEMÁTICA AMBIENTAL: DEFININDO SIGNIFICADOS

THE CONCEPTS OF ENVIRONMENT, ENVIRONMENT AND NATURE IN THE CONTEXT OF ENVIRONMENTAL ISSUE: DEFINING MEANINGS

Job Antonio Garcia Ribeiro1

Osmar Cavassan2

1Contato: job_ribeiro2005@yahoo.com.br

2Contato: cavassan@fc.unesp.br


Resumo

Apresentamos alguns esclarecimentos que nos possibilitam identificar diferenças entre as expressões natureza, ambiente e meio ambiente. Não se trata de um estudo epistemológico, mas sim de reflexões sobre a que se referem essas expressões e as implicações para a temática ambiental e, consequentemente para o Ensino de Ciências. A natureza foi compreendida como um complexo de entidades reais, as quais são passíveis de pensamento através da percepção. Essa mesma entidade ao ser representada por uma mente, passa a constituir o que denominamos de ambiente. Este, por sua vez, caracteriza-se não somente pela soma dos meios ambientes das espécies conhecidas, mas por ser uma abstração humana. Ao considerarmos a singularidade de cada espécie e organismo que nesse ambiente se insere, passamos a denominar de meio ambiente os elementos que podem ser percebidos e sobre as quais determinado ser pode atuar. Assim, buscamos elaborar um conceito de meio ambiente mais amplo, que não se restrinja à espécie humana.

Palabras clave:ambiente operacional, representação da natureza, mundo percebido, educação ambiental.


Abstract

We present some clarifications that enable us to identify differences between the expressions nature, the environment and environment. This is not an epistemological approach, but rather reflections on these expressions refer and the implications for environmental issues and hence to Science Teaching. The nature was understood as a complex of real entities, which are capable to be thinking through perception. This same entity when is represented by a mind, become what we call the environment. This expression, in turn, is characterized not only by adding the environments species that are known, but to be a human abstraction. When we consider the uniqueness of each species and organism, which in this environment is inserted, we call environment, this is, the elements that can be seen and on which the organism can act. Thus, we seek to develop a concept broader of environment, which is not restricted to the human species.

Keywords: operational environment, representation of nature, perceived world, environmental education.


Introdução

Nas últimas décadas observamos uma grande preocupação com as questões denominadas ambientais e ecológicas. A discussão dessa temática tem crescido consideravelmente, tanto nos meios de comunicação em massa quanto em revistas e periódicos especializados. Em grande parte dos casos, percebemos um discurso consensual a todas essas esferas, ou seja, o de que o ambiente, o meio ambiente ou a natureza é uma entidade com a qual a humanidade se relaciona, na qual está inserida e que deve ser preservada para que as futuras gerações mantenham condições saudáveis de sobrevivência.

Assim, temos presente nos discursos de ambientalistas, conservacionistas, educadores, ecólogos e outros grupos ligados à questão, o seguinte slogan: “cuidar do ambiente/meio ambiente/natureza e dos recursos para que não se esgotem” e para que “possamos desenvolver uma sociedade sustentável”.

No entanto, ao mesmo tempo em que a preocupação ambiental se torna mais frequente e que os debates passam a integrar maior número de pessoas, culturas e opiniões, temos também apropriações diversas de conceitos e, por vezes, uma homogeneização de significados.

Se os espaços de discussões em torno das temáticas ambientais e ecológicas estão sendo ampliados, o uso apropriado de terminologias como ambiente, meio ambiente e natureza, não tem sido discutido na mesma proporção.

Há na “linguagem ambiental” (Coimbra, A., 2002) ou “campo ambiental” (Carvalho, I., 2008), uma tendência à homogeneização de significados conceituais que são cada vez mais apropriados pelo senso comum, bem como uma diversidade de interpretações vazias de significados coerentes (Thomaz, S., 2001; Dulley, R., 2004; Fernandez, F., 2010).

Deste modo, defendemos a ideia de que para aqueles que se dedicam a estudar as questões ambientais e ecológicas, assim como seus fundamentos conceituais, o rigor na utilização das expressões ambiente, meio ambiente e natureza e, consequentemente, de seus significados é (ou ao menos deveria ser), aspecto fundamental.

Portanto, buscando fomentar um debate sobre as polissemias que envolvem as já citadas expressões, intentaremos neste recorte arbitrário discutir aspectos teóricos que possibilitem apontar diferenças significativas entre essas terminologias.

Não adotaremos nesse trabalho uma abordagem epistemológica ou etimológica dos conceitos, tal como fizemos em Ribeiro, J. e Cavassan, O. (2012), tampouco temos a pretensão de que nossas argumentações se constituam em palavra final, mas que ao menos possam promover reflexões e discussões no âmbito do Ensino de Ciências, em especial da Educação Ambiental.

1. Questões que nos conduziram à problemática

Primeiramente apresentamos alguns questionamentos para iniciar (e incitar) possíveis discussões. Estas indagações nos direcionaram a pensar sobre os conceitos de ambiente, meio ambiente e natureza, e também nas apropriações que deles fazemos. É evidente que poderíamos apontar muitas outras perguntas, no entanto, julgamos que estas já sejam suficientes para darmos início aos nossos argumentos.

a) Ao conjunto de tudo que existe, damos o nome de natureza, ambiente ou meio ambiente? b) A natureza é uma entidade real ou ela existe somente porque pensamos sobre ela? c) Se o homem não existisse, a natureza existiria? d) Conhecemos todos os elementos da natureza? e) O meio ambiente pode ser definido somente utilizando-se critérios espaciais? f) Poderia a expressão ambiente ser aplicada com o mesmo sentido a todos os seres vivos, os quais apresentam características fisiológicas distintas e particulares? g) O conceito de meio ambiente é específico para cada organismo? h) Um organismo interage com todos os elementos do ambiente? i) A natureza pode ser destruída pelo homem?

2. Natureza: entidade real passível de ser pensada/representada

A priori o vocábulo natureza nos remete a uma infinidade de significados. Dentre as definições que podemos ter estão: (I) princípio de vida; causa eficiente e final; princípio vital. (II) Substância ou essência necessária; conjunto das propriedades que definem algo. (III) Características particulares que distinguem um indivíduo; temperamento, idiossincrasia. (IV) Universo, conjunto ou totalidade das coisas naturais; o conjunto de tudo que existe. (V) Conjunto de seres que não o homem. (VI) Sistema de regras, ordem ou lei natural, cujas origens podem estar nas mãos do Criador. (VII) Tudo o que é inato, instintivo, espontâneo em um ser; opõem-se àquilo que é adquirido pela experiência individual ou social. (VIII) Aquilo a que estamos acostumados, os objetos e acontecimentos tais como habitualmente se apresentam; opõe-se ao que é sobrenatural (Lalande, A., 1999; Abbagnano, N., 2003). Além dessas conceitualizações temos outras mais.

Para Lenoble, R. (2002), por exemplo, a natureza que o homem conhece é sempre pensada, não sendo necessariamente um objeto real, mas sim uma criação humana e, portanto, uma abstração. Nessa acepção, o conceito de natureza pode variar conforme os grupos sociais de diferentes lugares e épocas, ou seja, passa a ser elaborado a partir das relações sociais construídas espaço-temporalmente.

Gonçalves, C. (2005) também defende essa perspectiva de que toda sociedade cria, elabora e institui uma determinada ideia do que seja a natureza. Para ele, a natureza se caracteriza por ser historicamente construída na medida em que as relações socioculturais se desenvolvem e, portanto, seu significado não é natural.

Outro exemplo que segue esse mesmo pensamento é o trabalho de Collingwood, R. (1978), que discute as diferentes concepções de natureza por meio de uma abordagem histórica. Segundo o autor, a história do pensamento europeu, por exemplo, caracterizou-se por três períodos de acordo com a ideia de natureza predominante: uma visão Grega, uma concepção Renascentista e uma visão Moderna. Vejamos.

Na primeira, a natureza é entendida como uma força que ordena o mundo, dotada de alma e mente própria, isto é, possuidora de uma vitalidade e de uma racionalidade. Assim, o denominado espírito estudado por Sócrates, Platão e Aristóteles, pré-existiria na natureza. Esta visão possuía como analogia o próprio ser humano, permitindo com que características intrinsecamente humanas fossem transpostas para a natureza.

Já a concepção de natureza presente na Renascença, entre os séculos XVI e XVII, caracterizava-se pela negação de que esta entidade era dotada de inteligência e vida. A natureza era incapaz de ordenar os seus próprios movimentos de uma maneira racional, tal como defendiam os gregos; não possuía intencionalidade ou movimentos próprios e, assim, não era comparável a um organismo, mas a uma máquina. Essa visão se baseava na ideia cristã de um Deus criador e onipotente, bem como na experiência humana da construção de máquinas (Collingwood, R., 1978).

A concepção moderna, por sua vez, apoiou-se nas teorias evolucionistas as quais possibilitaram entender a natureza como submetida a um estado constante de mudança. Embora houvesse elementos mecânicos na natureza, esta não mais poderia ser considerada uma máquina; isto porque, uma máquina é essencialmente um produto pronto, um sistema fechado e, portanto não se modificaria ao longo do tempo (ibid.).

O que queremos evidenciar é que independentemente da concepção de natureza adotada, todas essas visões apresentadas (Collingwood, R., 1978; Lenoble, R., 2002; Gonçalves, C., 2005), bem como outras trabalhadas por Merleau-Ponty, M. (2000), Carvalho, I. (2008), Thomas, K. (2010), e aquelas presentes no que Vargas, G. (2005) denomina de geografia construtivista, partem do princípio de que a natureza é uma abstração e o que se pensa sobre ela é influenciado pelo contexto sócio-histórico. Daí os diferentes significados existentes.

Acreditamos que o que varia de uma concepção para outra é, na verdade, como a natureza é representada, isto é, o que se pensa sobre a sua composição, a sua origem ou a sua finalidade. Não está em discussão um significado exato de natureza ou uma abordagem semântica, mas como as diferentes sociedades passaram a interpretá-la e, consequentemente, passaram a se relacionar com ela, ou seja, como os grupos sociais pensaram e manejaram suas relações com a natureza (Carvalho, I., 2008), portanto uma abordagem de aspecto significativo, que diz respeito ao sentido dado a essa expressão.

No entanto, Whitehead, A. (1993) apresenta que a natureza além de ser interpretação/representação é também realidade. Este filósofo britânico discorre a respeito da existência de dois significados para essa terminologia: no primeiro, a natureza pode referir-se a um complexo de entidades existentes que são percebidas por meio da apreensão sensível e que são passíveis de expressão no pensamento. No segundo, pode ser entendida como algo meramente abstrato fruto do pensamento; assim, o conceito de natureza seria aplicado àquilo a que estamos cônscios através da percepção.

Na primeira perspectiva a natureza é entendida como aquilo que se observa pela percepção através dos sentidos, o que implica dizer que ela independe do pensamento, ou seja, a natureza existe em si mesma e é factível de ser percebida. Entretanto, a percepção nunca está vazia (Merleau-Ponty, M., 2000) e, assim, ao tomarmos a segunda definição como referência, a natureza pode ser compreendida como algo pensado e, portanto, como uma construção humana. Desse modo, “o pensamento sobre a natureza é diferente da percepção sensível da natureza” (Whitehead, A., 1993, p.8).

Nessa última abordagem, ainda existiria duas formas de pensamento. A primeira delas é quando se pensa sobre a natureza, denominada de pensamento homogêneo, que está presente principalmente nas Ciências Naturais e que exclui qualquer referência a valores morais ou estéticos. Já a segunda forma de pensamento denomina-se heterogêneo e possui a Filosofia como representante; caracteriza-se por pensar sobre o que se pensa da natureza (Whitehead, A., 1993); seria assim uma metalinguagem, um processo metacognitivo. E é nessa segunda perspectiva que julgamos estarem inseridas as obras de Colingwood, R. (1978), Merleau-Ponty, M. (2000), Lenoble, R. (2002), Gonçalves, C. (2005), Carvalho, I. (2008) e Thomas, K. (2010).

Há, portanto, uma realidade “oferecida” ao conhecimento, ou seja, uma natureza como entidade, como causa da percepção (natureza causal), e há também uma realidade apreendida, fruto do pensamento, isto é, uma natureza pensada cuja origem está na reação da mente à natureza causal. Esta natureza abstrata é mais ampla e permite acréscimos de qualidades secundárias que estão relacionadas ao modo pelo qual o pensamento age sobre a natureza (Whitehead, A., 1993). E, assim, adquire dinamicidade e caráter temporal, sendo sempre nova a cada percepção (Merleau-Ponty, M., 2000).

Tomando Whitehead, A. (1993) como referencial, podemos dizer que a natureza ora pode ser entendia como um relato daquilo que o pensamento conhece (mente  natureza), ora como um relato da ação da própria natureza sobre a mente (natureza  mente). Assim, essa expressão adquire dois significados, sendo aplicada tanto para aquilo que tem uma existência e é percebido (realismo) quanto para aquilo que é pensado (representação). Para nós, esse é um dos motivos pelo qual surgem inúmeras confusões conceituais, ou seja, uma mesma expressão é utilizada para referir-se a duas abordagens distintas.

Acreditamos ser necessário utilizar diferentes terminologias para esses dois significados (natureza real ou causal e natureza representada ou pensada). Desse modo, iremos considerar que a natureza existe independentemente de se pensar sobre ela (imagine, por exemplo, a Terra sem humanos; a natureza existiria em si mesma, continuaria seu curso normalmente). Quando, no entanto, elaboramos qualquer raciocínio sobre ela, ou seja, quando esta entidade passa a ser representada por uma mente, passamos a falar de ambiente, não mais de natureza. Assim, argumentamos que o conceito de natureza se refere ao objeto mundo natural e a expressão ambiente à interpretação/representação desse objeto.

Retomando e respondendo as primeiras questões temos: ao conjunto de tudo que existe, damos o nome de natureza. Esta é uma entidade real que também pode ser pensada/representada. Quando assim o é, passamos a denominá-la de ambiente. Não conhecemos todos os elementos da natureza e somente aquilo que conhecemos e que, portanto, podemos representar compõe o ambiente. Consequentemente, se o homem não existisse, a natureza continuaria a existir, mas o ambiente não, pois não mais existiria natureza representada.

Essas colocações corroboram com as ideias de Uexküll, J. (1951) e Dulley, R. (2004), que também apontaram diferenças entre as expressões ambiente, meio ambiente e natureza.

3. Elementos do ambiente formam o meio ambiente

Segundo Abbagnano, N. (2003), a expressão ambiente refere-se a um complexo de relações entre o mundo natural e o ser vivo, que influi na vida e no comportamento desse mesmo ser. Logo, o uso dessa expressão deve levar em conta as características de cada reino, assim como, os componentes e relações que constituem o espaço no qual um organismo vive, isso porque a dependência dos seres em relação às características do ambiente varia de uma espécie para outra.

Em nível taxonômico as relações entre os animais não humanos e seu ambiente são diferentes das relações existentes entre os vegetais e seu ambiente. Os animais móveis, por exemplo, podem procurar o seu alimento, seu abrigo, fugir de seus predadores ou terem mais opções que os vegetais (teoricamente) para encontrar membros da sua própria espécie e proceder à reprodução (Branco, S.; Rocha, A., 1980).

Os organismos que se locomovem possuem uma ampla margem de controle sobre o espaço em que optam por viver, pois podem se deslocar de um local desfavorável e buscar outro, mais favorável. No entanto, os organismos sésseis não possuem tal “liberdade”, pois necessitam viver nas condições em que se encontram. Esses organismos são expostos a forças de seleção natural de uma forma particularmente intensa e, assim, o ambiente para um ser fixo adquire significado distinto do ambiente para um organismo móvel (Branco, S.; Rocha, A, 1980; Begon, M., Townsend, C.; Harper, J., 2007).

O que pretendemos evidenciar por meio dessa abordagem (predominantemente ecológica3) é que a expressão ambiente não pode contemplar todas as particularidades existentes de cada ser vivo. Um organismo “A” interage com determinados elementos do ambiente que não necessariamente são os mesmos com os quais um organismo “B” interage. Mesmo pertencentes ao ambiente, cada um possui seu ambiente particular ou mais especificamente, seu meio ambiente.

Um meio ambiente é, nesse sentido, algo que envolve ou cerca um indivíduo em particular, “é a penumbra das condições externas que para ele são relevantes em face das interações efetivas que mantêm com aqueles aspectos do mundo exterior” (Lewontin, R., 2002, p.54), ou seja, varia de acordo com o que é relevante para uma espécie ou organismo. Na relação entre organismo e ambiente, os seres selecionam quais elementos do mundo exterior devem estar presentes para a constituição dos seus meios ambientes e quais relações entre esses componentes são relevantes para os mesmos. Um meio ambiente não somente é caracterizado por meio da distribuição geográfica e temporal das espécies, mas principalmente como um espaço definido pelas atividades dos próprios seres (Lewontin, R., 2002)4. Assim, os indivíduos determinam os aspectos do mundo exterior que para eles são relevantes, em função de peculiaridades de sua morfologia e metabolismo, construindo ativamente seu arredor ou mundo externo.

Ideia semelhante é expressa por Mason, H. e Langenheim, J. (1957) ao argumentarem que não são todos os elementos do ambiente com os quais um organismo interage. Existem fenômenos não ambientais e fenômenos ambientais. Estes últimos referem-se a todas as classes de fenômenos que tem ou podem ter uma relação operacional com qualquer organismo.

Utilizando os conceitos de ambiente operacional e ambiente potencial os autores fazem duas considerações importantes: (1) que existem fenômenos que são imediatos e operacionalmente diretos e significativos para um organismo, e que compõe seu ambiente particular; e que (2) existem também fenômenos que não são imediatamente utilizados, mas que estão em condição futura de serem empregados operacionalmente.

Para se evitar uma interpretação polissêmica da expressão ambiente (environment), Mason, H. e Langenheim, J. (1957) utilizam os adjetivos operacional e potencial, para se referirem, respectivamente, aos fenômenos que entram efetivamente em relação com um organismo particular e aos fenômenos que são capazes de entrar em reação com esse organismo, mas que ainda não foram chamados a fazer. Para nós, essas expressões constituem o meio ambiente e o ambiente.

Dessa forma, Mason, H. e Langenheim, J. (1957) buscam dar ao conceito de ambiente operacional um caráter não somente espacial, mas também temporal e direcional. Uma vez que as demandas ambientais de um organismo variam ao longo de sua ontogenia é importante trazer o conceito de tempo para definir seu ambiente particular ou meio ambiente. Assim, o tempo de vida de um organismo é o tempo de duração de seu ambiente operacional, ou seja, durante o tempo em que um organismo está vivendo podemos falar dos fenômenos que incidem significativamente sobre ele, no entanto, quando o organismo morre essa relação cessa. Temos aqui a resposta à questão colocada no início desse trabalho: o meio ambiente não pode ser definido fazendo-se uso somente de critérios espaciais. Como ponderam Levins, R. e Lewontin, R. (1985), devido às particularidades das espécies e dos organismos, esse conceito é altamente heterogêneo em termos de tempo e espaço.

Portanto, o ambiente operacional, ou como sugerimos, o meio ambiente, é um conceito que está direcionado ao organismo, a um indivíduo em particular. Essa ideia, também encontrada na noção de umwelt de Uexküll, J. (1951), nos permite afirmar que a expressão ambiente não pode ser aplicada com o mesmo sentido a todos os seres vivos, os quais apresentam características morfofisiológicas distintas.

Foi na década de 1920 que Jacob Johann von Uexküll (1864-1944) popularizou a expressão umwelt, utilizando-a no sentido de relevant environmental, ou seja, aquele ambiente percebido por determinado organismo. Umwelt (um, à volta e welt, mundo) corresponderia ao ambiente comportamental que é próprio de uma dada espécie e que é construído por um conjunto de estímulos dotados de valores e significados (Klopfer, P., 1969).

Essa expressão marca a diferença entre o mundo tal como existe em si e o mundo enquanto mundo deste ou daquele ser vivo. Trata-se de um aspecto do mundo ao qual o organismo se dirige, que existe para o comportamento de um animal; é o meio ambiente de comportamento, que se opõe àquele geográfico (Merleau-Ponty, M., 2000).

Umwelt corresponderia ao mundo circundante, ao entorno, ao mundo associado, ou como acreditamos à expressão meio ambiente. Como consequência das propriedades dos órgãos dos sentidos, do metabolismo, do sistema nervoso e da própria forma do organismo, haveria uma justaposição espacial e temporal de diferentes elementos do mundo que produziriam, assim, um entorno ou mundo externo relevante para o organismo (Lewontin, R., 2002; Levis, R.; Lewontin, R. 1985). Esse mundo exterior seria “destilado” pelo animal que por meio dos dados sensoriais obtidos poderia responder-lhe com determinadas ações (Merleau-Ponty, M., 2000).

Nesse sentido, compreender a relação entre organismo e ambiente é reconhecer os signos que a espécie é capaz de perceber, é relacioná-los com suas ações, é definir seu círculo funcional (Heredia, J., 2011) e, portanto, seu ambiente operacional. O meio ambiente corresponde à relação específica que os seres constroem e mantêm com o mundo. Um animal, por exemplo, só percebe o que “deve perceber”, leva em conta seus signos e ignora o resto. Isso ocorre devido a seus diferentes receptores e efetores, também denominados de órgãos perceptivos e operacionais, respectivamente (Heredia, J., 2011).

Cada animal posee determinados órganos para recibir los efectos del mundo exterior, que son llamados receptores u órganos de los sentidos. La estructura de los receptores decide cuáles efectos del mundo exterior ejercen un estímulo sobre el animal y cuáles no. La suma de estos estímulos forma un mundo circundante del animal. Cada animal vive en un mundo especialmente dispuesto para el, que concierta com su espécie de estructura y sólo es capaz de presentarle los problemas adecuados (Uexküll, J., 1951, p.36-37).

Assim, a biologia de um organismo determina o seu meio efetivo e estabelece a maneira pela qual os sinais externos são incorporados. Os elementos externos do mundo físico e biótico (e também social, no caso da espécie humana) passariam por um “filtro transformador” criado pela biologia específica de cada indivíduo, de cada espécie, e é justamente o resultado dessa transformação que atinge o organismo e se torna relevante para ele (Lewontin, R., 2002). “Cada sujeito tece suas relações como os fios de uma teia de aranha com certas características das coisas e os entrelaça para fazer uma rede que mantém sua existência” (Uexküll, T., 1965, p.29 apud Merleau-Ponty, M., 2000, p.285).

Além do termo umwelt, Uexküll distingue outras duas expressões: umgebung e welt. A primeira referindo-se ao horizonte visual e entorno físico que caracteriza a percepção humana (portanto, no nosso entendimento sinônimo de ambiente) e welt ao universo científico, ao mundo objetivo, à realidade absoluta (Canguilhem, G., 2001; Heredia, J., 2011), ou seja, à natureza. Ambiente se diferenciaria de meio ambiente (umwelt) pelo fato de que condições exteriores idênticas acarretam diferentes possibilidades de comportamentos, isto é, de ações e percepções.

Essa ideia da existência de um ambiente particular (meio ambiente), distinto de um ambiente total (ambiente) é também destacada por Josef Pieper no trabalho de Tuan, Y. (1965). Na tentativa de diferenciar dois conceitos, ambiente (environment) e mundo (world), o autor cita os trabalhos de Pieper no qual este aponta que haveria diferença entre os “mundos” que cercam cada indivíduo. Fazendo uso da expressão world como sinônimo de “campo de relações” o filósofo discorre que apenas uma entidade capaz de se relacionar, isto é, somente os seres vivos possuem um “mundo”. Uma rocha, por exemplo, não possui um campo de relações, ou seja, não atua sobre o ambiente físico, embora ocupe um lugar e componha a natureza.

Nesse sentido, uma planta possui um mundo sobre o qual age mais limitado do que um animal que se locomove. Consequentemente, o mundo humano, por assim dizer, é mais representativo que o mundo dos demais animais, uma vez que o Homo sapiens possui uma gama maior de interações (Tuan, Y., 1965). Assim, se o termo “mundo” de Pieper for substituído por “meio ambiente”, teremos também uma distinção conceitual clara entre as expressões ambiente e meio ambiente.

4. Natureza, ambiente e meio ambiente: distinguindo significados

Para Dulley, R. (2004), é a partir do conhecimento da natureza que o homem constrói seu meio ambiente. O meio ambiente ou meio ambiente humano, na realidade, refere-se ao conhecimento que o homem acumulou e possui da própria espécie e de suas inter-relações. No entanto, a humanidade não apenas passou a conhecer a si própria, como também as interrelações das demais espécies, ou seja, o meio ambiente de cada uma delas. Para todo esse conjunto de “meios ambientes” (meio ambiente humano, meio ambiente vegetal etc.) o autor utiliza a terminologia ambiente.

Apoiando-se em Art, H. (1998), Dulley, R. (2004) conceitua ambiente como o conjunto de condições que envolvem e sustentam os seres vivos na biosfera como um todo ou em parte desta, abrangendo elementos do clima, solo, água e os organismos. Meio ambiente, por sua vez, é concebido como a soma total das condições externas circundantes no interior das quais um organismo ou um objeto existe.

“[...] poder-se-ia dizer que ambiente seria, portanto, a natureza conhecida pelo sistema social humano (composto pelo meio ambiente humano e o meio ambiente específico das demais espécies conhecidas)”, afirma o autor (ibid., p.20). Nessa perspectiva a natureza pode ser definida, tal como conceitua Whitehead, A. (1993), como uma entidade passível de ser pensada e estaria, assim, constantemente sendo transformada em ambiente, em decorrência do constante aumento do conhecimento do homem sobre ela.

O ambiente de Dulley, R. (2004) associa-se a todas as espécies, enquanto que meio ambiente estaria ligado sempre a uma espécie em particular, àquilo que esta considera relevante (Lewontin, R., 2002), ao termo umwelt de Uexküll, ou à expressão ambiente operacional de Mason, H. e Langenheim, J. (1957). No caso da espécie humana, seu meio ambiente corresponderia à natureza conhecida, modificada em relação aos interesses do seu sistema social, sobre o qual age e do qual recebe influência.

Temos, portanto, ao agregarmos a essas colocações os argumentos já apresentados, a existência de uma natureza causal (natureza real ou welt), compreendendo o mundo vivo e o não vivo que engloba todas as espécies, incluindo o homem. Este, por sua vez, dispõe da capacidade de pensar e entender a natureza, assim a transforma em ambiente, ou seja, em uma natureza conhecida (natureza pensada), cujos elementos nela contidos são selecionados e podem ou não fazer parte de seu mundo particular (meio ambiente). Além do meio ambiente humano, há os “meios ambientes” (umwelten) das demais espécies, que não são constituídos exatamente pelos mesmos elementos da natureza que compõem o meio ambiente do homem. A esse conjunto dos meios ambientes de todas as espécies conhecidas pelo homem Dulley, R. (2004) denomina de ambiente.

O que diferencia nossa concepção de meio ambiente daquela utilizada por Dulley, R. (ibid.) é que para ele esta entidade só existe porque o homem é capaz de pensar sobre ela. Para nós, os meios ambientes das demais espécies existiriam, independentemente de nossa racionalidade, uma vez que as relações operacionais dos organismos continuariam a existir. Em suma, para Dulley, R. (2004), o ambiente e os meios ambientes só teriam existência com a presença humana, já para nós a ausência do Homo sapiens implicaria na ausência de uma entidade pensada, ou seja, do ambiente, e na inexistência do meio ambiente humano, os demais meios continuariam existindo.

Observemos então as duas concepções de natureza apontadas por Whitehead, A. (1993) – natureza real e natureza pensada. A sugestão é que tais expressões sejam entendidas como natureza e ambiente, respectivamente. A primeira trata-se de uma entidade, cuja existência independe do homem, ou seja, existe sem que necessariamente se pense sobre ela e que Uexküll denomina de welt, constituída tanto de elementos não ambientais quanto de fenômenos ambientais, como diriam Mason, H. e Langenheim, J. (1957).

Já a segunda (ambiente), se refere ao entendimento da natureza, ao que se pensa sobre ela (homo ou heterogeneamente); leva em consideração a limitação dos sentidos e do aparato cognitivo humano e, assim, corresponde ao que da natureza se pode perceber. Equivale à expressão umgebung (horizonte visual e entorno caracterizado pela percepção humana) também utilizada pelo etólogo alemão e compõe o que Mason, H. e Langenheim, J. (1957) denominam de ambiente potencial, ou seja, os fenômenos que julgamos serem capazes de entrar em reação com um organismo, mas que ainda não foram chamados a fazer.

Todavia, como cada organismo possui aparatos perceptivos e de ação diferentes, mecanismos morfofisiológicos distintos e ontogenia específica, cada um constrói seu meio ambiente (umwelt) ou ambiente operacional. Conceito este definido e ordenado espaço e temporalmente pelo organismo.

Como uma forma de síntese dessas ideias apresentamos o quadro a seguir (figura 01) com nossas definições conceituais que se apoiam na literatura já citada.

Em um exemplo adaptado de Lewontin, R. (2002) é possível distinguirmos as terminologias propostas: em determinado jardim, na qual se encontram árvores, gramíneas e pedras espalhadas pelo chão, pode-se dizer que um ramo seco da grama faz parte do meio ambiente (umwelt ou ambiente operacional) de uma ave “X” que utiliza esse elemento para construir o seu ninho (em um momento reprodutivo de seu ciclo de vida) e que, portanto, a percebe como relevante. Já as pedras ali existentes, embora façam parte do ambiente potencial (ambiente ou umgebung), podem não ser utilizadas naquele momento por esse indivíduo. Contudo, essas mesmas pedras fazem parte do meio ambiente (umwelt ou ambiente operacional) de um pássaro “Z” que as utiliza para abrir caracóis e comê-los. Estes mesmos gastrópodes podem ser indiferentes para a ave X e compor os elementos denominados de não ambientais.

Entretanto os elementos que compõem o ambiente acima exemplificado só puderam ser observados ou pensados por uma mente, por uma consciência e, nesse sentido, o ambiente é determinado ou definido como a natureza conhecida pelo homem. A noção de ambiente é, portanto, resultante do pensamento e do conhecimento humano, isto é, do seu trabalho intelectual (simbólico) e físico sobre a natureza (Dulley, R., 2004).

Assim, partimos do pressuposto de que a natureza não é meramente uma abstração, tal qual defendem Collingwood, R. (1978), Lenoble, R. (2002) e Gonçalves (2005), mas sim o que se pensa dela, ou seja, o ambiente sim é uma representação. Ao contrário do que nos diz Gonçalves, C. (2005), de que o conceito de natureza não seria natural, sugerimos que, na realidade, é o conceito de ambiente que adquire essa configuração.

A natureza existe em si mesma ao passo que o ambiente refere-se aos elementos que pensamos compô-la, que nossa capacidade humana alcança e representa e é, portanto, constantemente ressignificado. Dentre todos os elementos que se acredita compor o ambiente e que se localizam num dado instante em determinado espaço geográfico, somente aqueles que são percebidos pelas capacidades perceptivas e sobre os quais cada organismo age e opera podem ser considerados integrantes do ambiente individual, ou seja, do meio ambiente, do umwelt ou do ambiente operacional.

Logo, no contexto das sociedades humanas compreendemos o meio ambiente não como a soma de tudo que existe, mas como um lugar determinado ou percebido, onde os elementos naturais e sociais estão em relações dinâmicas e em interação. Essas relações implicam processos de criação cultural e tecnológica e processos históricos e sociais de transformação do meio natural e construído (Reigota, M., 1998, p.14).

O meio ambiente humano é determinado temporalmente e percebido em função de representações particulares; está em relação dinâmica no sentido de que é permanentemente construído e, portanto, estabelecido e caracterizado por diferentes culturas em espaços específicos (Reigota, M., 1998; 2009) e também de acordo com a ontogenia da espécie humana. Essa entidade é compreendida como um espaço relacional no qual o indivíduo está inserido e age sobre todo um sistema social, político e econômico, pois é capaz de percebê-lo. Assim, construímos nosso próprio mundo externo, nosso umwelt, nosso meio ambiente subsidiados por processos sígnicos (perceptivos), ou seja, pelas atividades receptoras e efetoras que caracterizam a nossa espécie.

Portanto, o conhecimento sobre a natureza, baseia-se na apreensão dos processos e elementos existentes e que podem ser observados. Consequentemente, elaboramos esquemas mentais que estão intimamente relacionados com as experiências individuais de cada um. Cada ser humano está cercado por um mundo “adequado” ou acomodado (Uexküll, J., 1951), que se refere ao mundo circundante, ao meio ambiente.

5. Considerações finais

Diante do objetivo proposto, acreditamos que foi possível apontar diferenças significativas entre as terminologias ambiente, meio ambiente e natureza, assim como responder às questões inicialmente levantadas. No entanto, estamos cientes de que esta investigação está longe de ser finalizada. Fizemos apenas um recorte subsidiados por alguns referenciais teóricos (principalmente da Ecologia).

Cabe agora questionarmos, tal como fazem Mason, H. e Langenheim, J. (1957) em suas conclusões: que diferença tudo isso faz? Mais especificamente, que implicações essas discussões conceituais podem ter? Seguem algumas respostas.

Primeiramente podemos destacar que a distinção terminológica apresentada permite questionar, por exemplo, os objetivos das políticas ambientais, quando as mesmas almejam a preservação do meio ambiente. Ora, o que se quer dizer por essa expressão? Estamos contemplando as diferentes necessidades morfofisiológicas de cada organismo ou buscamos somente resguardar o meio ambiente humano? Estamos preocupados com a preservação dos ambientes operacionais das demais espécies ou com a manutenção daqueles fenômenos com os quais a espécie humana interage e dos quais depende?

Evitamos também apoiar certos discursos radicais de que a sociedade acabará com a natureza. Na verdade, os sistemas sociais produtivos humanos podem interferir no meio ambiente de outros organismos, como também podem tornar o meio ambiente humano impróprio para nossa sobrevivência levando à exclusão do Homo sapiens da natureza. Todavia isso não implica dizer que, concomitantemente, a natureza deixaria de existir.

Outro ponto relevante é que, ao distinguirmos os significados dessas expressões, podemos ter mais clareza sobre quais são os objetos de estudo das diferentes áreas do conhecimento. As Ciências Ambientais, por exemplo, utilizam um pensamento homogêneo da natureza, ou seja, buscam interpretá-la e elaboram representações do ambiente, investigando todo e qualquer meio ambiente, ao passo que, a Educação Ambiental faz uso de uma metalinguagem, de um pensamento predominantemente heterogêneo, ou seja, pensa sobre o que se pensa sobre a natureza, além de focar seus estudos no meio ambiente humano.

Superar a ideia de que o ambiente deve incluir obrigatoriamente as questões econômicas, políticas e sociais é outra contribuição deste trabalho. Se estivermos nos referindo ao meio ambiente humano, esses elementos fazem sentido, assim como é pertinente defini-lo como “um campo de interações entre a cultura, a sociedade e a base física e biológica” (Carvalho, I., 2008, p. 37). Contudo esse mesmo significado não pode ser aplicado aos demais seres. As particularidades de cada organismo devem ser levadas em consideração. Assim, defendemos que o meio ambiente humano deva ser considerado em suas múltiplas dimensões (econômicas, sociais, políticas etc.), mas essa singularidade não cabe aos demais meios ambientes.

Ao considerarmos o meio ambiente como sendo constituído de elementos que envolvem ou cercam uma espécie ou indivíduo em particular, que são relevantes para o mesmo e que entram em interação efetiva, esse conceito passa a ser geral e abrangente, contemplando as particularidades de cada organismo e não se restringindo unicamente ao Homo sapiens. Tem como elemento central o próprio organismo.

Entretanto, cabe ressaltar que não estamos desconsiderando a complexidade humana, ao contrário, entendemos que nossa particularidade se dá por um fato fundamental: o homem, ao contrário dos demais seres, não se comporta somente como espécie, mas sim como indivíduo. Para Branco, S. (1999), nas espécies não humanas os indivíduos são incapazes, aparentemente, de iniciativas “pessoais” que os ponham em conflito com o meio e ameacem a sobrevivência filogenética. Já o comportamento do homem é individual, consciente e de livre iniciativa. Isso implica dizer que a consciência e a vontade, muitas vezes, não são da comunidade, mas de cada indivíduo em particular, podendo diferir de um para outro. E a discussão dessa perspectiva requer uma abordagem mais detalhada, que não caberia nessas páginas.

Buscamos também transcender a ideia de que todos os fenômenos são essenciais para um organismo. Assim, ao eliminarmos os fatores indiretos e os “corpos estranhos”, removemos muito da frustrante complexidade do ambiente e passamos a nos limitar aos fatores diretos, os quais podem ser confirmados empiricamente (Mason, H.; Langenheim, J., 1957). Essa definição é justificável uma vez que os fenômenos que afetam diretamente os organismos são os objetos primários de interesse em qualquer análise ambiental (Spomer, G., 1973).

E, por fim, este trabalho permite afirmar que a natureza não é apenas fruto da mente, mas possui um caráter dual, sendo tanto uma entidade passível de pensamento quanto uma entidade real. Consequentemente, pode-se assumir que o ambiente estudado pelos cientistas por meio da observação e experiência, por se tratar de uma natureza pensada, é na realidade um mundo antropocêntrico, uma vez que consiste em processos naturais que estão dentro dos limites da observação/percepção humana (Collingwood, R., 1978).

Referências Bibliográficas

ABBAGNANO, N. Dicionário de filosofia. São Paulo: Martins Fontes, 2003. ART, H. Dicionário de ecologia e ciências ambientais. São Paulo: UNESP/Melhoramentos, 1998.

BEGON, M.; TOWNSEND, C.; HARPER, J. Ecologia: de Indivíduos a Ecossistemas. 4ª ed. Porto Alegre: Artmed, 2007.

BRANCO, S.; ROCHA, A. Ecologia: Educação Ambiental – ciências do ambiente para universitários. São Paulo: CETESB, 1980.

BRANCO, S. Ecossitêmica: uma abordagem integrada dos problemas do meio ambiente. 2ª edição. São Paulo: Editora Edgar Blücher LTDA, 1999.

CANGUILHEM, G. Living and its Milieu. Grey Room. v.3, p. 6-31, 2001.

CARVALHO, I. Educação ambiental: a formação do sujeito ecológico. São Paulo: Cortez, 2008.

COIMBRA, J. O outro lado do meio ambiente: a incursão humanista da questão ambiental. Campinas: Millennium, 2002.

COLLINGWOOD, R. A ideia da natureza. Editorial Presença. Lisboa, 1978.

DULLEY, R. Noção de natureza, ambiente, meio ambiente, recursos ambientais e recursos naturais. Revista Agricultura em São Paulo. v.51, n.2, p.15-26, 2004.

FERNANDEZ, F. In PETRY, A. C.; PELICICE, F. M.; BELLINI, L. M. (Orgs.) Ecólogos e suas histórias: um olhar sobre a construção das ideias ecológicas. Maringá: Eduem, 2010.

GONÇALVES, C. Os (des)caminhos do meio ambiente. 12ªEd. São Paulo: Contexto, 2005.

HEREDIA, J. Etologia animal, ontologia y biopolítica en Jakob von Uexküll. Filosofia e História da Biologia. v.6, n.1, p.69-86, 2011.

LALANDE, A. Vocabulário técnico e crítico da filosofia. São Paulo: Martins Fontes, 1999.

LENOBLE, R. História da ideia de Natureza. 1ªed. Lisboa: Portugal; Edições 70. 2002.

LEWONTIN, R. A tripla hélice: gene, organismo e ambiente. São Paulo: Companhia da Letras, 2002.

LEVINS, R.; LEWONTIN, R. The dialectical biologist. Harvard University Press, 1985.

MASON, H.; LANGENHEIM, J. Language Analysis and the Concept “Environment”. Ecology. v.38, n.2, p.325-340, 1957.

MERLEAU-PONTY, M. A Natureza. São Paulo: Martins Fontes, 2000.

REHBEIN, M. Ensaios sobre o meio (ambiente): os significados de natureza por olhares geográficos. Revista Geografar. v.5, n.1, p.155-175, 2010.

REIGOTA, M. Meio ambiente e representação social. 3ªed. São Paulo: Cortez, 1998.

______. O que é Educação Ambiental. 2ªed. São Paulo: Brasiliense (Coleção primeiros passos; 292), 2009.

RIBEIRO, J.; CAVASSAN, O. Um olhar epistemológico sobre o vocábulo ambiente: algumas contribuições para pensarmos a Ecologia e a Educação Ambiental. Filosofia e História da Biologia, v.7, n.2, p.241-261, 2012.

SPOMER, G. The concepts of “interaction” and “operational environment” in environmental analyses. Ecology, v.54, n.1, p200-204, 1973.

THOMAS, K. O homem e o mundo natural: mudanças de atitude em relação às plantas e aos animais (1500-1800). São Paulo: Companhia das Letras, 2010.

THOMAZ, S. In MEDEIROS, M.; BELLINI, L. Educação Ambiental como Educação Científica: desafios para compreender ambientes sob impactos. Londrina: Editora UEL, 2001.

TUAN, Y. “Environment” and “World”. The Professional Geographer. v.17, n.5, p.6-8, 1965.

UEXKÜLL, J. Ideas para una concepción biológica del mundo. Buenos Aires: Espasa-Calpe, 1951.

UEXKÜLL, T. A teoria da Umwelt de Jakob von Uexküll. Galáxia, p.19-48, 2004.

VARGAS, G. Naturaleza y medio ambiente: una visisón geográfica. Revista Geográfica Venezolana. v.46, n.2, p.289-304, 2005.

VILÀ VALENTÍ, J. Las distintas visions geográficas de las relaciones entre Naturaleza y Hombre. Revista de Geografía. v.18, p.5-17, 1984.

WHITEHEAD, A. O conceito de Natureza. São Paulo: Martins Fontes, 1993.

Artigos Semelhantes

<< < 22 23 24 25 26 27 28 29 30 31 > >> 

Você também pode iniciar uma pesquisa avançada por similaridade para este artigo.

Loading...